A Carta
Tem filmes que assistimos e não esquecemos porque os enredos nos tocam profundamente, daí porquê o cinema é a sétima arte, ela nos arrebata e transporta para uma dimensão chamada fantasia. Desde o começo até o fim do filme o expectador, sentado na poltrona com ou sem pacote de pipoca nas mãos, não sente o tempo passar. A magia do cinema é única porque tem som, imagem, atores, diretores, música, enredo, produtores, figurinistas e centenas de coadjuvantes e empregados anônimos que tornam possível a realização de cada película. Não tem quem não tenha um filme preferido e atores e atrizes inesquecíveis, por isto não sou exceção. Lamento não ser um cinéfilo como o renomado jornalista Marden Machado por isto não lembro o nome do filme que assisti anos atrás, que começou quando uma garrafa lacrada, contendo dentro uma carta, que foi jogada no mar e encontrada na beira de uma praia distante, por uma pessoa que após ler o seu conteúdo resolveu encaminha-lá para uma jornalista. A mensagem
era de amor, escrita por alguém que perdera a esposa e resolveu contar a felicidade que teve ao lado de sua amada. A jornalista que trabalhava num grande jornal convenceu o chefe do editorial que a carta poderia dar uma grande reportagem e, por isto, autorizada viajou por várias cidades litorâneas até encontrar o autor da mensagem. E do encontro ambos se apaixonaram, mas a vida de ambos era diferente, ocorreram divergências e resolveram acabar com o relacionamento. Daí as cenas mais perturbadoras até terminar o filme que ficou gravado na memória de muitos. Não sei se o nome do filme era “A Carta” mas asseguro que vale a pena assistir ao lado da mulher amada, para viver momentos de puro romance repleto de emoções. Fiz esta introdução, nesta minha crônica, só pela curiosidade que tenho em saber se jovens até vinte ou mais anos de idade tiveram alguma vez a oportunidade de redigir uma carta e remetê-la pelo Correio ao seu destinatário. Sim, porque, hoje o Correio serve mais para postagens de comunicações oficiais do governo, documentos comerciais, remessa de mercadorias e veículo de propaganda. Mas carta mesmo, deve ser uma raridade, porque a mídia eletrônica, a telefonia e os computadores serviram para diminuir as distâncias e permitiram uma comunicação relâmpago. A carta é sinônimo de demora e no mundo moderno ficou obsoleta. Daí, porquê, minha curiosidade em saber se jovens sabem como escrever uma carta de amor para a sua eleita. E telegrama ? Será que eles sabem o que é um telegrama ou pelo menos já viram um deles? Tenho sérias dúvidas. Ah, lembrei de uma ocorrência que aconteceu comigo, cujo desdobramento foi inusitado, porque começou por um impulso e terminou em tragédia. Quando fui Promotor de Justiça na Comarca de Faxinal, cidade do Norte pioneiro e divisa com o estado de São Paulo, eu era noivo da minha garota que morava em Curitiba. Escrevi dezenas de cartas para ela (estão guardadas em um armário do nosso apartamento), mas, um dia, quando estava passando na frente do posto do Correio daquela cidade, resolvi entrar e mandar um telegrama para minha noiva.
O atendente me entregou um formulário para que eu escrevesse a mensagem, cujo preço era cobrado pelo número de palavras a serem retransmitidas pelo telégrafo.
Não pensei duas vezes e escrevi: “Eu te amo”. Paguei e nunca perguntei para minha mulher se ela tinha recebido ou não, pela singeleza do “recado”. Casamos, percorremos juntos outras comarcas do interior, passaram alguns anos, quando um dia chegou na casa de minha falecida sogra o dito cujo telegrama.
Nele, além do texto que eu tinha escrito, constava, também, um pedido de desculpas da Empresa dos Correios e Telégrafos pelo atraso da correspondência, por ter servido a mesma de prova em processo administrativo e criminal contra o funcionário da estatal que cobrou pela emissão do telegrama e apropriou-se indevidamente do dinheiro. E como esclarecimento final ficou o registro de que o servidor foi exonerado do cargo e condenado criminalmente. E não é mentira não, o fato é verídico, como também o é, o tempo em que a Justiça Criminal gozava de total credibilidade…
“Nas cartas para minha noiva escrevi todas elas com tanto amor e carinho, que passados cinquenta e três anos desde as nossas bodas, lembro de cada uma delas. E o único telegrama que enviei deu o que falar.
Acho, sinceramente, que um dia, minhas cartas ainda vão parar num museu.”