A Sombra.
11 de fevereiro, sábado.
Viva hoje é sábado o melhor dia da semana. Eu pelo menos acho porque é véspera de domingo, um dia depois dos considerados dias úteis, e com a perspectiva de que amanhã dá tempo para desfrutar do lazer e do merecido ócio. Nenhum outro dia é igual ao de hoje.
É por isso que escrevo sem compromisso, dedilhando meu diminuto telefone sob o comando de meu pensamento que vaga no tempo em busca de assunto que possa se ajustar no pequeno espaço de minhas crônicas. Só me preocupo com os erros crassos de concordância e uso inadequado dos verbos porque é difícil dedilhar em uma tela e tentar corrigir as frases, pois não tenho domínio sobre a tecnologia e desconheço a boa técnica de seu uso.
Espero sempre que o leitor releve minhas mazelas que atentam contra as regras do bom vernáculo, mas que me perdoem porque não são intencionais. Não tenho paciência para revisar os textos. Ah!
Enquanto escrevia me justificando meus pensamentos voltaram ao passado, trazendo recordações dos verdes anos de minha vida. São lembranças das viagens dos sábados, dia da semana propositadamente reservado para vir à Curitiba nas épocas das ferias forenses ou em períodos de extrema necessidade. Na época eu era Promotor de Justiça e morava com a família, esposa e dois filhos menores em Umuarama, cidade da região noroeste do estado, localizada a 610 quilômetros da Capital. À distância e as condições das estradas não permitiam viagens rotineiras, além do mais as crianças eram pequenas dificultando ainda mais os deslocamentos.
Estes quase sempre eram feitos nas cidades próximas, em ocasiões especiais e esporádicas de confraternizações com colegas residentes nas comarcas vizinhas. Portanto quando se avizinhava o dia de viajar à Curitiba o alvoroço familiar era contagiante, o reencontro com os pais, avós, cunhados, tios, primos e amigos era quase um sonho que estava prestes a se tornar realidade. Os meninos não falavam outra coisa senão na viagem e em rever os avós que pouco convivia pelo amargor da distância.
Cada mala de roupas que era fechada fazia crescer a ansiedade, o sentimento do reencontro familiar próximo motivava e alegrava nossos corações. Apesar de tudo isso, havia outra expectativa, a da viagem em si. Meu carro era um Volkswagen, modelo Passat, quatro portas, e faltava espaço para tanta bagagem. Compreensível, porque o período de férias é de trinta dias e, portanto era óbvio que sempre faltaria espaço para acomodar tudo o que era necessário.
Na viagem o sonho acalentado era o de parar na localidade Bairro dos Franças, na Rodovia do Café, localizado entre a descida da Serra do Cadeado e a cidade de Ortigueira . Ali, sob a sombra enorme de um flamboyant, eu estacionava o carro para o nosso tradicional piquenique de viagem. Minha esposa preparava uma cesta de guloseimas, frango assado, pão caseiro, bolo, frutas e naquele local isolado, ao lado da estrada, nós desfrutávamos da alegria da vida. E nunca deixamos de cumprir este ritual em todas as viagens que fazíamos.
Foram momentos preciosos, quase mágicos, e que temos gravado em nossa memória. Há três anos quando viajei a serviço na camioneta do Tribunal Regional Eleitoral, época em que fui Presidente, passei pelo Bairro dos França e não vi mais o flamboyant, no seu lugar foi construído uma casa.
Sinal dos tempos. A querida árvore não dá mais sombra, ela vive apenas na lembrança e na saudade daqueles que puderam usufruir do seu abrigo e proteção. Assim é a vida em que todos passam só as recordações dos bons momentos é que ainda vivem no coração de poucos.
A acolhedora sombra se esvaiu no rodamoinho do tempo, seu ciclo chegou ao fim quando a velha árvore foi derrubada ou porque estava morta. Mas não era uma sombra qualquer, era reflexo escuro dos galhos frondosos de um enorme flamboyant que deu abrigo há muitos, e para minha família também! Ah! Que saudades!