Água Quente, Moço!
Ontem, 22 de janeiro, domingo.
Deixo de lado assuntos mais sérios para abordar, por ser domingo.
É um dia para que o barco de minhas lembranças navegue livremente no mar de meus pensamentos até encontrar a motivação para um assunto ameno, que sirva para tornar esta leitura a mais agradável possível. Pois hoje é domingo!
Dias atrás a Imprensa abriu espaços para falar sobre o falido Sistema Penitenciário brasileiro. Foram muitos comentários, críticas e propostas para solucionar os graves problemas. Porém é preciso conhecer de perto o difícil mundo dos presídios e suas diversas facetas. Claro que não vou abordar questões técnicas neste espaço telegráfico, apenas fatos amenos para uma leitura descompromissada.
Afinal, hoje é domingo! Ninguém ignora por certo o que é o terror do confinamento para quem cumpre pena em regime fechado, sendo implantado em uma Penitenciária. A ociosidade pela falta de ocupação, a saudades da família, a disciplina e o medo embrutece qualquer ser humano. A expectativa de alcançar a liberdade é um anseio natural e sobreviver no cárcere é uma necessidade vital. Portanto, nada deve gerar expectativas no ambiente porque serve de estopim para rebelião.
E toda rebelião gera um palco de tragédias. Quando fui Secretário de Estado da Justiça e tinha sob minha responsabilidade administrar todas as Penitenciárias estaduais, ocorreram inúmeras rebeliões no Brasil. Nenhuma em nosso estado. Certa feita um ilustre Juiz da Comarca de Londrina, com competência para fiscalizar as cadeias públicas, cioso e trabalhador resolveu adentrar na Penitenciária Estadual a fim de cumprir seu trabalho.
Na conversa com os presos anotou as reivindicações e expectativas que os mesmos achavam que tinham, como progressão da pena para o regime semi-aberto e transferência para outro estabelecimento prisional, comprometendo-se a dar uma solução em um prazo razoável .
Acontece que a Corregedoria dos Presídios era uma só, a dos Juízes das Varas de Execução que estavam instalados na Capital. Estes Juízes é que detinham competência para fiscalizar as Penitenciárias. Os Juízes do interior eram corregedores das cadeias públicas, nada mais.
Como o Juiz de Londrina tinha que obter informações sobre a regularidade dos presos que ele anotara na inspeção junto a Vara de Execuções de Curitiba, demorou o retorno das informações aos interessados. Estes insatisfeitos e entendendo existir o descaso da autoridade tentaram, mas não conseguiram iniciar uma rebelião no presídio.
Inteirado do motivo proibi o acesso do Juiz nas dependências daquela Penitenciária Estadual. O Juiz ao tomar conhecimento ameaçou-me com ordem de prisão. Mantive a ordem dada e a questão foi noticiada pelo magistrado ao Presidente do Tribunal de Justiça, o saudoso des. Henrique Chesneau Lens Cesar.
Este me telefonou tentando solucionar o impasse. Expliquei o motivo da proibição e ele entendeu, mas não poderia desprestigiar a autoridade do Juiz denunciante. Concordei que só revogaria a minha ordem se o Juiz da Vara de Execuções delegasse a competência ao seu colega de Londrina.
O Presidente concordou. Nunca houve a tal delegação e o incidente ficou por isso mesmo. Em outra oportunidade eu fui chamado às pressas para comparecer na Penitenciária Estadual de Piraquara para constatar um fato nunca visto na história do Sistema Prisional do Paraná. Perguntei o que era e não obtive resposta, porque o Diretor queria que eu visse com meus próprios olhos.
Na Penitenciária fui conduzido para o sótão e quando vi não pude conter a gargalhada. Na maior caixa de água da Unidade os presos "colocaram" um "rabo quente" de proporções gigantescas para esquentar a água a fim de tomarem banho ! Apurado o principal autor da proeza, ele apenas justificou:
- É pra esquentar a água, "seo" moço!
Preso ele já estava e preso continuou...