Ai, que preguiça!
Ontem Guaratuba começou o dia chorando pela tristeza de saber que hoje, antes do almoço, estarei subindo a serra de volta à Curitiba e não parou mais de chorar; confesso que já estou saudoso de ver a mar. A vida é assim mesmo, um vai e vem, daqui para acolá, onde somos protagonistas e as vezes testemunhas do que acontece no cotidiano. Um dia estamos cheios de ideias e em outros com vontade de ficar olhando o tempo passar. E ele passa depressa : já estamos quase deixando Janeiro para trás. Eu acordei com uma preguiça de monge, sim, pois estes homens sagrados mais rezam (sem sair do lugar), contemplam, meditam, sempre sentados sobre as pernas, como se estas fossem molas de sofá. Uma peripécia que não me atrevo a fazer sob o risco de nunca mais conseguir levantar e nem andar. Estou me sentindo zen -, sem vontade de nada, nem de pensar, e muito menos dirigir meu Fiat 147, vermelho táxi, placas pretas, para atravessar o também preguiçoso ferryboot e percorrer a rodovia até me desmontar na minha cadeira preferida, ao chegar em casa. Não tenho nem vontade de escrever uma só linha para a minha crônica de hoje, contudo, penso, tento girar a manivela da minha criatividade para ver se extraio algum assunto, mas nada, nadica de nada. Estou com a mente entumecida pela preguiça. E pelo jeito a minha escrita não vai pegar nem no tranco. Fico pensando “ainda bem que não vivo para escrever, pois se vivesse morreria de fome”. Pô, ao escrever esta frase lembrei do saudoso Mussa José de Assis, jornalista dos bons, foi redator-chefe dos jornais “Tribuna do Paraná” e “O Estado do Paraná” ambos de propriedade do dr. Paulo Pimentel, que diariamente brindava seus leitores com matérias de fundo que eram verdades em forma de jornalismo. Vou contar um fato curioso sobre nossa amizade. Eu como Promotor de Justiça criminal da Capital, denunciei o Mussa e mais quarenta e um outros jornalistas por crime de difamação e calúnia baseado na Lei de Imprensa, por veicularem notícia tendenciosa sobre as condutas profissionais de um Juiz e um Promotor dentro do exercício de suas funções em um inquérito policial, decorrente de um crime praticado dentro de uma sauna em que foi vítima um menor. O indiciado rotulado na imprensa como “tarado” foi preso em flagrante e posteriormente o Promotor opinou pelo relaxamento da prisão, parecer que foi acatado tecnicamente pelo Juiz. Daí a imprensa noticiou que “correu dinheiro embaixo do pano: Juiz e Promotor soltam tarado.” Este o motivo da minha denúncia. Foi quando o Mussa escreveu como matéria principal do jornal “O Estado do Paraná” crítica voraz contra minha pessoa por ter oferecido uma denúncia objetivando cercear o direito de liberdade e de opinião dos jornalistas denunciados. Engoli seco mas como bom cabrito não berra absorvi aos poucos o golpe recebido. Mas graças a omissão do relator do feito no extinto Tribunal de Alçada o recurso interposto pelo Prof. Alcides Munhoz Neto, então advogado da Associação dos Jornalistas do Paraná, o delito prescreveu. Ninguém foi condenado.
Anos depois, fui encarregado pelo meu colega dr. Ronaldo Botelho, Presidente da Associação Paranaense do MP para elaborar uma “coluna informativa” de assuntos institucionais para ser veiculada pelo jornal “O Estado do Paraná”. E isto me obrigava toda semana a entregar a matéria na redação do referido jornal. E em uma destas ocasiões o próprio Mussa recebeu de minhas mãos a matéria para publicação, dai em diante, fazia questão de me receber no seu escritório para conversarmos. Ele não sabia que eu fora o autor da denúncia no qual ele foi um dos denunciados. Certo dia o Ronaldo Botelho me acompanhou até o jornal para pleitear um espaço maior na publicação, quando na conversa com o Mussa lhe contou que eu fui o autor da denúncia contra os jornalistas. Surpreso o Mussa levantou de sua cadeira e me deu um forte abraço, pedindo desculpar pelo editorial que tinha escrito. Ele entendeu que eu estava cumprindo a obrigação de meu ofício. Fomos amigos até o seu precoce falecimento. Tenho por ele a maior consideração e apreço, como um amigo que deixou saudades. Puxa, fui reler o que eu escrevi e fiquei surpreso que escrevi mais esta crônica, sem sentir mais preguiça…
“Sempre reverencio a memória de amigos que fiz pelas esquinas da vida, pessoas que me deixam saudoso e me fazem acreditar no gênero humano. Lembro, também, daqueles que ainda privo da amizade, pelas suas importâncias em minha vida. Pois amigos são tesouros que Deus nos presenteou.”’
Édson Vidal Pinto