Cara a Cara Com o Inimigo
Dá até um frio na espinha imaginar que dois inimigos nada polidos estejam no mesmo lugar ao mesmo tempo e disputando as atenções dos presentes; e o pior : frente a frente. Eu pessoalmente não tenho ninguém que possa considerar inimigo, quando muito não tenho afinidade com certas pessoas, que evito encontrar mas quando não posso suporto a presença sem deixar de dormir bem a noite.
Esta falta de empatia faz parte da natureza humana e não existe explicação plausível para este tipo de aversão. Mas pensar num inimigo que é causa de dissabores e preocupações estar sentado bem na frente e cada contendor tentar disfarçar a vontade de se engalfinhar e ter que olhar para os lados, a fim de não encarar o desafeto, deve ser tarefa diabólica. E foi justamente assim que o Bolsonaro e o Luiz Ignácio devem ter sentido ao se depararem no auditório do TSE, quando da posse do novo presidente daquela Corte o Alexandre Moraes, em cerimônia ocorrida no final da tarde de anteontem em Brasília.
Óbvio que a presença do Bolsonaro foi para atender o protocolo do cerimonial, pois ele como Chefe do Executivo não pode evitar de estar presente quando das posses e cerimônias oficiais do Poder Judiciário. Queira ou não queira. A intenção é preservar as relações republicanas entre os Chefes dos Três Poderes e autoridades representativas. E muita gente deve estar se perguntando o porquê do Alexandre ter convidado o seu protegido Luiz Ignácio, que nem autoridade é e não represente nada no contexto da República.
Dada as circunstâncias atuais do quadro político nacional e desconfiança da proteção escancarada que as Cortes Superiores da Justiça tem com o petista, a presença deste pode ensejar estranheza e provocação ao Bolsonaro. Mas não corresponde à verdade.
É praxe do TSE que nas cerimônias de posse de seus presidentes sejam também convidados os ex-Presidentes da República que presentes ao ato sentam em cadeiras colocadas em destaque na primeira fila do plenário. Na posse em comento também estavam presentes o Sarney, a Dilma e o Michel Temer. É por assim dizer uma tradição da referida Corte e não um convite especial formulado a um ou outro ex-Presidente. Portanto, presença do Luiz Ignácio nada teve de excepcional; quando presidi o TRE do Paraná e estive na posse do Dias Toffoli (2.014) na presidência daquele Tribunal, estavam presentes o FHC e o Sarney, sentados lado a lado. Eu só estive presente na posse do Toffoli para cumprir o protocolo do qual não poderia me furtar, embora não fosse de minha vontade pessoal.
Ônus da representação do cargo. Fui e o cumprimentei desejando êxito na gestão que iniciava, tudo de acordo com o figurino. Mas que engoli seco, engoli. E assim devem ter se sentido o Bolsonaro e o Luiz Ignácio na posse do Moraes, que com certeza fingiram ignorar a presença um do outro, mas com uma vontade danada de mandar aquele armistício cerimonioso às favas. Acho que ambos reservaram suas munições para serem usadas no campo da batalha política. Taí outra situação do qual jamais gostaria passar -, disputar a preferência de votos e enfrentar inimigos gratuitos. Haja estômago. Mas cada indivíduo pensa, reflete e age de maneira diferente por isto o mundo da política é suficientemente habitado. Ainda bem, porque se não fosse assim, não teríamos ninguém para pendurar no poste e depois malhar sem dó e nem piedade …
“Se conviver com inimigo não é fácil, imagine dormir ao lado dele. Esta última hipótese foi até tema de filme. Se na política o inimigo de hoje é o amigo de amanhã, dá para imaginar conviver
nesse palco? Haja estômago.”
Édson Vidal Pinto