Carros Liberados!
Viva, viva, viva! Glória ao Salvador: até que enfim o Rafael acabou com a quarentena imposta aos veículos e estes desde ontem podem estacionar no Parque Barigui. Terminou o suplício dos seus proprietários de esconder seus carros nas imediações do parque a fim de fugirem das multas dos guardas municipais, implacáveis no cumprimento da restrição imposta com o fechamento daquele logradouro público.
Claro que mencionada ordem para manter o parque fechado em virtude da pandemia era apenas para inglês ver, pois quem sempre se exercitou no lugar não deixou um só dia de frequentá-lo, ficando a restrição exclusiva para os veículos. Explico: era proibido estacionar veículos nos estacionamentos sob pena de multa e apreensão.
Ora, quem gosta de andar ou de fazer exercícios não se afastou destas práticas pois o Covid-19 não assustou nenhum dos atletas, mesmo porquê o local é suficientemente arejado e mantida a distância o perigo da contaminação era mínimo. E da varanda do meu apartamento vi uma quantidade de carros estacionados e logo pensei:
- É agora que vou ao parque!
Só não fui de carro porque moro perto e posso ir a pé. Coloquei um training, camiseta e tênis e fui caminhando em direção ao Barigui, disposto a comemorar o fim da restrição imposta. Saí tão eufórico que nem me dei conta da baixa temperatura e o ventinho gelado que cortava o ar matinal, só quando cheguei na pista asfaltada para pedestres bem próximo da ponte dos fundos, que senti um arrepio na espinha. Mesmo assim, como tinham muitas pessoas andando e eu para não fazer feio, aumentei o passo a ponto de quase correr, porém o frio ao invés de diminuir aumentou um pouco mais. De repente senti meus lábios gelados, minhas mãos frias e em pouco tempo meu corpo todo estava como bloco de gelo.
E o pior: eu não tinha outra opção que não voltar o mais rápido possível para casa. Dei meia volta e retornei pelo mesmo caminho que fui passando entre as pessoas e desviando os cachorros levados pela coleira pelos seus donos. E o ventinho cortante aumentou sua velocidade a ponto de atravessar o meu agasalho.
Num determinado trecho tive vontade de gritar de tanto frio que estava sentindo, foi quando o pior aconteceu:
- Moço, moço, por favor o senhor pode parar um pouco?
- ?
- Sou da TV Paranaense, Canal 12, será que o senhor não nos concede uma entrevista?
- Sooobrree ooqueee ?- indaguei.
- Sobre a abertura do parque.
- Acho melhor que não ...
- Por quê? O senhor é contra?
- Sim, sou contra a abertura do parque;contra o Prefeito; contra o frio; contra o PT; contra o Lula ..,
- Por quê?
- Porque eu sou friorento e o frio me faz perder o bom humor, por isso não querro dar entrevista.
O repórter viu que eu estava exaltado, pediu desculpas e prosseguiu em busca de outro entrevistado. Eu aumentei meu passo enquanto sentia o frio congelar meu cérebro e apenas corri quando avistei o prédio onde moro. Quando abri a porta do meu apartamento eu estava me sentindo um verdadeiro picolé ambulante. Quis gritar para minha mulher ouvir que eu já estava em casa, mas a voz não saiu.
Aumentei a tonalidade e só um grunhido saiu da minha boca -, acho que a língua estava colada no meu céu da boca. Então li um recado que estava sobre a mesa da casa: “Meu bem: fui comprar frutas. Já volto”. Peguei outro e escrevi com letras trêmulas: “cheguei. Fui tomar banho com água bem quente.
Estou morrendo de frio!”. Daí entrei no banheiro, liguei o chuveiro e não caiu nem um mísero pingo de água. Reflexo da estiagem. Foi então que enchi meus pulmões e gritei:
- Meus Deus! Que dia, que mês, que ano !!!!
“Frio intenso é um castigo para quem não gosta. A gente fica sem ação e mau humorado. E levantar cedo, então? É uma provação. Feliz é o urso que hiberna enquanto o inverno passa!”
Edson Vidal Pinto
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