Carta Para Um Jovem Advogado
Na semana passada recebi cópia de uma carta que me foi entregue pela querida amiga Eliena Arruda Wolff, esposa de meu colega do Curso de Direito o empresário Aldo Wolff, datada de 31 de dezembro de 1.966 em que seu saudoso pai e culto advogado dr. Oscar Arruda escreveu para um seu estagiário de escritório de nome Osmar para felicitá-lo pela formatura.
Li e reli o texto e por achar atual o seu teor vou reproduzi-lo nesta crônica por se prestar não apenas aos jovens advogados como também àqueles profissionais mais calejados na profissão para uma oportuna reflexão acerca do respeito à Justiça. Vale referir que o dr. Oscar é pai da saudosa Ministra do STJ dra. Denise Arruda, colega de Toga no Tribunal de Alçada do Paraná e homenageada pelo TJ do Paraná que deu seu nome para designar o Centro Judiciário de Curitiba ( Fórum ).
“Meu caro Osmar : Encarrego sua mocidade de medir o estado de alma do velho bacharel ao receber o convite de formatura do novo bacharel. Volto ao passado e me vem à lembrança o menino quieto e trabalhador, curvado à máquina de escrever, aparentemente alheado do ambiente, caso não observássemos a vida que havia em seus olhos curiosos, voltados para os incidentes e debates das audiências. O certo é que , mercê de Deus, não me enganei. O que augurava então ao dr. Ary e a outras pessoas, vem se realizando. Você está vencendo na vida, tendo condições de realizar muito mais. Conhece, bem, você, o ambiente do fórum e sabe como ele é. É apaixonante até em suas mazelas. No entrechoque de paixões, das idéias, dos interesses contrários, há uma constante - a preocupação, ainda que por vezes hipócrita, de se fazer sentir a autoridade da Lei.
É frequente invocá-la, mesmo através de falsas interpretações. No fundo, bem no fundo, está o sentimento de respeito à Lei. Ter a consciência do Direito e verificar que essa consciência se ajusta às exigências da Lei é criar um mundo de harmonia interior. Com o avançar dos anos, é natural que a soma das decepções crie o desencanto na alma da maioria dos homens. No advogado, não. Nossas feridas cicatrizam depressa e quando não cicatrizem, não temos tempo para tratá-lãs porque nossas feridas nos aguardam em novas lutas.
No final, com os anos decorridos, ficamos como aqueles velhos legionários romanos, que combateram nos gelos da Britânia, nas florestas da Germânia, nas montanhas da Ilíria, que giram o mar Atlântico na Ibéria, que sentiram na carne a flecha do inimigo. Quando voltam, então velhos, cansados, estropiados. Mas sentem orgulho das cicatrizes que ostentam e os enfeiam. São marcas da grandeza de Roma. Guardadas as devidas proporções, assim somos nós advogados, quando temos consciência de nossa profissão. Sentimo-nos como numa atividade missionária para maior glória de Themis, augusta, serena, imparcial e incorruptível. Pouco importa que, por vezes, algum sacerdote seu deslustre seus mistérios.
Outros mais lhe zelarão o culto. Vejo que estou me estendendo, abusando, até, do seu tempo. Perdoe-me os lugares comuns. Sei que você não irá rir do velho legendário, por mais medíocres que sejam as palavras dele. Mas há algo de original nesta carta - nunca me estendi tanto num agradecimento. Maior que ela são os votos de felicidade do seu amigo certo, que, com cordialíssimo abraço, subscreve-se comovido.
Oscar “.
“As cartas que hoje caíram de moda em razão da tecnologia e dinâmica nas comunicações, são testemunhas da sapiência dos grandes literatos. As palavras eram escritas com a alma e de valor ímpar.
A carta em questão escrita há mais de meio século por sua atualidade deveria ser lida em todas as festas de formatura dos novos Bacharéis em Direito”.
Édson Vidal Pinto