Casa Alugada
Tem muitas famílias que programam o ano inteiro para curtir as férias no litoral, alugando casa e até apartamento para temporada. E quando os locatários são só marmanjos é fácil de identificar porque eles amontoam latinhas de cervejas na frente da residência e colocam no último volume da caixa de som do automóvel, as piores músicas do sertanejo universitário para a vizinhança compartilhar. E todos eles acham que têm direito de gritar de quando em quando, soltar foguetes e falar em voz alta, sem respeitar o sossego alheio. E quando saem em bando, a pé, para irem à praia carregam duas ou três caixas de isopor com latinhas de cerveja, cadeiras e guarda-sol, tudo com intuito de só retornarem quando a noite chegar.
Acho que são adeptos da “Teoria da Libertação” do Boff -, pois vale tudo para ser feliz! Mal comparando parecem membros de uma mesma seita de branquelos e mulheres carcomidas recém-saídas da roça, com crianças elétricas e prontas para se afogarem ao primeiro mergulho. E se você tiver curiosidade para saber em quais cidades residem, dizem as más línguas que nove entre dez veranistas vem de Irati, Campo Mourão, Cidade Gaúcha, Ponta Grossa, Pato branco, Cascavel, Ivaiporã e Piraquara.
Eu sentado na cadeira da área em frente de casa fico imaginando tudo isso e mais alguma coisa, quando olho um novo cortejo de outros “iguais” passarem pela rua, há poucos metros de onde estou tirando estas minhas conclusões. São mais ou menos umas dezoito pessoas, velhos, jovens e crianças falando alto e sem se importarem com a chuva. Sem esconder, também, que há três casas da minha esquerda, tem uma propriedade alugada que pode abrigar confortavelmente umas doze pessoas, só que tem quase quarenta.
Especulei e fiquei sabendo que é uma família de São Jerônimo da Serra, eles chegaram ontem à noite e vieram em sete veículos. Eu sei quando chegaram porque não consegui mais dormir: fizeram churrasco que esfumaçou e cheirou por toda a rua até o amanhecer do dia, muitos brincaram dentro de uma pequena piscina sem medo da chuva. E para desespero da vizinhança dentre eles tem um único acordeonista que dedilhou horas a fio o maldito instrumento sem parar, tentando tocar tudo que tem direito, só acho que não sabia muito bem, pois não chegou a terminar nenhuma música que começou.
A folia dos “novos” vizinhos só parou quando a polícia chegou. Acredito que algum vizinho incomodado é que deve ter chamado. Putz, só fico imaginando o que vai sobrar da casa depois que essa turma for embora. Infelizmente ninguém mais cuida do que é dos outros. São poucos os inquilinos civilizados e cumpridores de obrigações. Neste exato momento o bairro está calmo, a turba de madrugadores deve estar dormindo ou foi à praia.
Se estiver dormindo acho que terei de enfrentar uma nova noite de “serenata” entremeada de muita conversa e ao som da gaita. Na dúvida vou rezar para que chova mais forte e que o frio traga um pouco de neve, para arrefecer os ânimos dessa gente que parece ser possuída por bicho carpinteiro por todo o corpo...
“Quando na vizinhança da praia alguém aluga uma casa para terceiros é pior que mosquito da dengue. Dá dor de cabeça, enjoo, desânimo e irritação. Mas faz parte das férias. Quem não quiser se incomodar, que vá acampar no deserto de Atacama.”
Edson Vidal Pinto
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