Eta, Cachaça Boa!
Ninguém é de ferro, quando é sábado o último dia da semana, o melhor é digerir uma leitura amena e menos rebuscada. Não é momento de falar em política, políticos, violência, barbaridades e nem da vida alheia.
Optei, então, por escrever episódio de um passado distante, quando eu então Promotor de Justiça fui morar com minha mulher e filho primogênito , na Comarca da Lapa.
Eu sempre digo para as pessoas de minha conivência mais próxima que embora tenha orgulho de ser Curitibano, por amor aos meus ancestrais também sou meio Antoninense (capelista) e lapeano.
Meu nome de família Vidal Pinto vem dos portugueses radicados em Antonina, terra de meu inesquecível avô paterno e de meu pai; e a Lapa porque foi berço de nascimento de meus bisavós, avós maternos, de minha mãe e tios. E quando fui morar na Lapa - no início de 1.972 - pude sentir de perto como o lapeano ama sua pequena e histórica cidade, de casas centenárias, ruas estreitas, o Teatro São João, o santuário de São Benedito e a Gruta do Monge. Lá residem famílias tradicionais, pacatas, ordeiras, trabalhadoras e respeitáveis. É um local em que a palavra empenhada vale “um fio de bigode”.
Esta é uma expressão que equivale a certeza de que toda promessa (trato) será cumprida. Foi por indicação dos funcionários do fórum que consegui alugar uma pequena casa de material, com cinco peças: sala de visita, dois quartos, copa conjugada a cozinha, e um único banheiro.
O bom é que ela era bem conservada e tinha nos fundos um pequeno quintal com um tanque de lavar roupas e tinha um varal de arame, para enxugar dezenas de fraldas. Com o salário curto o aluguel era ao menos suportável para o bolso.
A casa estava localizada na rua Cel. Eduardo Corrêa, que passava ao lado da Igreja Matriz de Santo Antônio, Padroeiro da cidade. A atividade cotidiana era de casa ao fórum e vice versa. E minha mulher se ocupava com a casa e cuidava do nosso menininho. Num sábado, depois do almoço, resolvi passear com o meu filho, que estava aprendendo andar, pela calçada da rua, quando tive a intenção de ir caminhado até a esquina e voltar.
Bem no cruzamento de duas ruas funcionava uma pequena empresa que tinha um alambique e engarrafava cachaça para vender na região.
Quando me aproximei o proprietário, querendo ser atencioso, me chamou:
- Promotor, o senhor não quer conhecer o nosso alambique?
Eu não conhecia o homem, porém para não fazer desfeita aquiesci o convite.
Entrei e logo senti que exalava álcool por todos os lados, percorri rapidamente o ambiente e sai porta afora. E o dono sempre do meu lado mostrou todo o processo de decantação da cana-de-açúcar até resultar na “marvada pinga”.
Já do lado de fora, perguntei ao empresário:
- Vi que as garrafas são envasadas com o mesmo tipo de aguardente, porém, também observei que nas garrafas cheias são colocados três tipos de rótulos com nomes diferentes. Por quê?
- Ah, doutor, é verdade. Aqui produzimos uma única pinga de um mesmo alambique, mas somos obrigados a colocar no comércio garrafas com rótulos de nomes diferentes.
- ?
- Porque tem consumidor que só toma pinga de um único nome do rótulo de sua preferência, e jura que as garrafas com os nomes das outras duas pingas, não prestam e dão muita dor de cabeça!
E deu uma risadinha marota. Agradeci o convite e votei em casa. Até hoje quando lembro desse fato dou risada; vá entender o gosto de quem toma bebidas destiladas ...
“No cotidiano tudo acontece e para um bom e atento observador é motivo para muitas histórias. Cenas comuns podem se prestar para uma leitura sem maiores compromissos. As vezes vale a pena ler , outras nem tanto, mas com certeza não perturbam a alegria de viver!”
Edson Vidal Pinto