Fiat Lux!
Olhei umas duzentas vezes pela janela do meu quarto e depois belisquei meu braço para ver se não estava sonhando e não estava. Enfim: fez-se a luz! O astro-rei resolveu dar as caras por Guaratuba depois de uma longa pausa.
E tudo começou ontem depois do almoço e ao que parece vai continuar assim por alguns dias, se a meteorologia não me desmentir. Com o sol a pino procurei fazer planos para todo o dia, começando por uma viagem de navio entre os portos de Guaratuba e de Caiobá. Prevenido, telefonei para a companhia de navegação e reservei um camarote de luxo, com varanda externa, para apreciar melhor o remanso da baía. Também reservei um lugar no porão para colocar meu carro.
Minha mulher e eu gostamos de conforto por isso, também, optei por uma mesa no restaurante ao lado de uma das janelas da esplendorosa embarcação. Um pouco antes de embarcar fui até uma operadora de Câmbio e comprei cinco mil euros, pois no navio e nas boutiques de Caiobá só vendem mercadorias para quem tiver dita moeda. De igual às gorjetas dos empregados de bordo.
No embarque muita gente para assistir à partida, foguetes, serpentinas e a orquestra filarmônica da cidade. Muitas lágrimas rolaram. Uns dez minutos após deixar o cais os passageiros foram chamados para as instruções de salvamento, foi nesse treinamento que dei de cara com ele e a Janja.
- Olá, companheiro!
- Oi.
- respondi sem muita convicção, ainda sentindo impacto do súbito encontro.
- O companheiro também vai a Caiobá?
- Vou.
- A passeio, negócio ou compras?
- Compras...
- Onde?
- No paraguaizinho...
- Tem televisão de oitenta polegadas? A minha noivinha quer uma para dar de presente ao Haddad.
- Acho que tem. Se procurar bem no meio das quinquilharias achará com certeza. - respondi com má vontade.
- E onde fica, companheiro?
- Na praia brava.
- Obrigado.
- De nada.
Que encontro do peru, pensei eu com meus botões, tanta gente no navio e fui encontrar logo o Luiz Ignácio. E de imediato fiquei com o estômago embrulhado. Acho que foi o molusco que comi no almoço. E imagine tudo isso em dose dupla. Fui no convés e destripei o mico. Meu estômago não aguentou.
- Aceita um lencinho de papel? - disse uma voz meio feminina.
E quando olhei a mulher não aguentei: continuei destripando o mico. É muito azar a Dilma no mesmo barco? Putz , será uma convenção de Metralhas ou vão saquear os passageiros?
Não respondi e subi para o camarote. Contei para minha mulher e ela ficou cética, pois não quis acreditar. Recomendou que eu ficasse na varanda do aposento enquanto ela iria procurar saber se tudo não passava de invencionice de minha fértil imaginação. Ela saiu e eu fiquei no camarote. De repente ela abriu a porta e gritou:
- Este navio é um hospício!!
- O que você viu de tão grave?
- A Maria Louca encima de um cavalo preto pintado de branco galopando nos corredores e a Benedita correndo atrás e gritando: “Vamos tomar o timão do Navio!”
Minhas pernas tremeram. Da varanda do camarote eu vi o galeão pirata que faz o passeio pela baía de Guaratuba chegar bem perto do navio, para matar a curiosidade dos turistas. Sem pensar duas vezes, gritei para minha mulher:
- Pule no convés do galeão!!
E assim nós dois deixamos o navio de luxo para trás. O capitão do navio pirata preocupado me perguntou:
- Tá louco, homem! Poderia ter morrido!!
Dei de ombros e abracei minha mulher. Vi o navio se afastar cada vez mais, só então recuperei a calma. Quando o galeão retornou ao cais de Guaratuba foi que me dei conta que meu carro tinha ficado no porão do navio. Nestas horas ele por certo estava sendo cobiçado pelo Luiz Ignácio. Eu então pensei resignado: melhor que vá o anel, mas que fiquem os dedos...
“E tudo acontece em Guaratuba. Chova ou faça sol todo o dia é uma surpresa atrás da outra. Só espero não encontrar com o Bonner e o Pablo Vittar de mãos dadas, apesar de ter ouvido em uma lanchonete próxima do Morro do Cristo, que ambos foram vistos juntos, saltitantes, na praia dos paraguaios. Juro que não vou conferir. Quem quiser, que vá!”
Edson Vidal Pinto
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