Homem de conhecimento
E por ser domingo parece próprio comentar sobre um livro que li há muitos anos atras, cujo conteúdo é uma tese de doutorado de autoria de Carlos Castanheda que na época cursava uma Universidade Americana, que se transformou num livro intitulado “A Erva do Diabo”. O núcleo da questão foi a busca do autor em se transformar em um homem de conhecimento e para isto teria que sair da bolha que envolvia seu pequeno mundo para alcançar distâncias só alcançadas por alguns poucos. E foi assim que numa viagem que fez no interior do México ele conheceu um índio, homem de idade, conhecido na região como sendo místico e profundo conhecedor dos mistério da vida. Curioso procurou nas conversas mantidas com o velho obter informações sobre seus vastos conhecimentos, dizendo que estaria disposto em aprender o que lhe fosse ensinado, porém, sem conseguir nos primeiros encontros nenhuma aparente concordância de que pudesse alcançar seu intento. Quando estava para desistir, o índio lhe perguntou se estaria com coragem suficiente para se submeter as provas que lhe aguardavam, pois teria que vencer o medo, sem o qual não conseguiria romper a barreira do seu pequeno “eu”. Sem titubear Castanheda aceitou e prometeu que nada impediria que fosse até as últimas consequências. O índio então concordou e marcou para começarem o ritual no amanhecer do dia seguinte, em sua casa. Bem cedinho Castanheda foi recebido pelo índio que lhe mostrou encima da mesa pequenas pelotas de vegetal, dando-lhe o nome de “peyote”, explicando que os mesmos foram extraídos das pontas dos cactos que infestavam a zona desértica da região. Disse que com eles é que preparava o chá que fazia as pessoas viajarem e conhecerem lugares para adquirir sapiência. O chá estava preparado, também, encima da mesa. O aprendiz tomou pela primeira vez. Sua cabeça rodou, seus olhos viram um carrossel de cores brilhantes como jamais visto, de repente surgiu em sua frente o esplendor da natureza num cenário que extasiava , foi quando sentiu a força do vento esvoaçar os seus cabelos e então retornou para o interior da casa. Não precisou muito para logo deduzir que o chá feito com o peyote era uma poção com efeito alucinógeno. Em uma segunda fase na busca do conhecimento o aprendiz após tomar o chá começou a ver imagens retratando cenas do cotidiano passando ante os seus olhos, eram cenários onde os atores estavam tomados de uma alegria contagiante; e outras mergulhados em tristeza como se estivessem ao desamparo pedindo que tudo acabasse. E como na “viagem” anterior o aprendiz, suado e ofegante, voltou para dentro da casa. Estava assustado mas não pensava em desistir, acreditava que as “viagens” serviam para poder chegar ao mundo do conhecimento, quando então teria descoberto o sentido de estar vivo. Fez uma terceira viagem e viu que estava no alto de uma montanha onde seus olhos não conseguiam enxergar além das nuvens, sentiu o poder da liberdade, da força e do domínio sobre todos os seres vivos que estavam sob seus pés. Uma estranha sensação que não era própria dos seres humanos. Quando “voltou” para interior da casa do velho índio, achou que já tinha ido longe demais. Mas sua curiosidade lhe impulsionava para seguir em frente. No quarto dia o aprendiz tomou o chá e num piscar de olhos viu que estava no topo da mesma montanha do dia anterior, só que não era mais um homem e sim uma grande e poderosa águia cujas garras pisavam firme sobre uma rocha, mantinha as asas fechadas para que o vento não o fizesse alçar voo, olhou o horizonte e sem sentir estava deslizando na imensidão do espaço, passando entre as nuvens, tendo certeza que na próxima vez o seu voo iria além da sua imaginação para entrar na desconhecida dimensão que o tornaria um homem de conhecimento. Foi quando sentiu medo, medo de entrar para o outro lado, de poder desvendar o desconhecido e o inalcançável. Tudo suficiente para voltar para casa e acordar como homem. Entendeu que a experiência foi longe demais, desculpou-se com o índio que lhe abriu as portas para conhecer além do mais recôndito mistério, mas não voltaria para tomar o chá de peyote.
Pois os segredos e mistérios que transcendem o conhecimento humano pertencem apenas ao Criador, e a mais ninguém…
“O livro em questão eu li há mais de dez anos, talvez não tenha sido fiel ao descrever as “viagens” que o autor fez, para se tornar um homem de conhecimento. Devo ter embaralhado o conteúdo original com a minha própria imaginação. Mas vale a pena ler a referida obra, pela riqueza de situações e detalhes bem mais preciosos, que deu o título de doutor ao seu autor.”