Na Bota da Itália
Depois de trabalhar dos catorze aos setenta anos de idade sem interrupção e exclusivamente para o serviço público do Estado do Paraná, tenho o privilégio de desfrutar da aposentadoria do jeito que eu quero : fazendo voluntariado no Centro de Conciliação dos recursos em trâmite no Tribunal de Justiça; presidindo Concurso Público para funcionários do TJ; participando como Conselheiro Barão da Junta Comercial do Paraná e também do Grupo Pró-Paraná que promove eventos em defesa dos interesses do estado; e escrevendo minhas crônicas diárias para não embotar a mente.
Claro que alguns destes compromissos sem maiores obrigações de presença em decorrência do Covid-19. Mas cada dia por ser um novo dia e nova experiência eu procuro aproveitar cada momento que estou em casa, sempre buscando alguma coisa para fazer, como forma de viver a alegria de respirar e estar ao lado da mulher amada. Ontem no período da tarde resolvi ligar a TV e sintonizar o YouTube para fugir da mesmice da programação e tranquilamente assisti o concerto do violinista André Rieu em uma praça da cidade de Verona, região do Vêneto, sempre com apresentação de músicas selecionadas, muito bem executadas, cantadas e que levou o público compartilhar com inusitado entusiasmo.
Não fui exceção. Vibrei com tudo que assisti e ouvi e quando terminou o espetáculo desliguei a TV para dedilhar esta crônica, na tela diminuta do meu telefone celular. É claro que tomado pela emoção e ainda curtindo os sons maviosos dos instrumentos musicais, a Italia não saiu do meu pensamento. E é para lá que eu vou tentar transportar os leitores na viagem que fiz por aquela terra sem nenhuma intenção de soberba e muito menos para arrotar grandeza, mas sim, para relatar fatos pitorescos e jocosos acontecidos no passeio.
Fizemos o vôo São Paulo/Veneza pela Alitalia, uma companhia de aviões muito bem voados e aeromoças cuja idade variava entre cinquenta e sessenta anos de idade. A noite elas serviram um jantar tipo maria-mole, que tem um único sabor, uma laranjada artificial e logo que recolheram os pratos, apagaram as luzes e foram dormir. Só apareceram mesmo no dia seguinte quando o avião estava chegando no seu destino. Não precisa dizer que nós estávamos na classe turística, com assentos tão próximos uns dos outros que quando alguém de madrugava levantava para ir ao banheiro todos os demais passageiros acordavam e viam o vulto do infeliz esbarrando nas poltronas por onde passava.
E depois de quarenta ou mais pessoas usarem dos mesmos banheiros, quando alguém abria a porta exalava um cheiro maldito por toda a aeronave. E ninguém reclamava, pois todos fingiam que eram pessoas ricas e educadas pois iriam passear na Itália.
Eu imitei os demais porém só cometi um grande mico quando em plena madrugada acendi a luz do teto para chamar qualquer das aerovelhas, pois queria um copo de água para tomar remédio, mas apareceu um único e jovem comissário de bordo com cara de sono e emburrado por ter sido despertado, que ouviu o meu pedido, apagou a luz de chamada e nunca mais voltou. No desembarque vi o sujeito na porta de saída do avião cumprimentando alegremente os passageiros, mas quando chegou minha vez eu falei:
- Obrigado pela água!
Ele me deixou passar e de repente como se estivesse falando com a velha aeromoça que estava na sua frente só ouvi quando ele gritou bem alto:
- Cara cretino ! Cretino!
Não me virei e nem reagi porque eu estava de férias e na terra alheia e sabia que o Gilmar não estava por perto, pois ele gosta é de Portugal. Mas até hoje eu ouço aquela palavra dita num sotaque bem italiano. Fui apanhar as malas e elas não chegaram, registrei a reclamação e dei o endereço do hotel onde ficaríamos hospedados por três dias para depois embarcar de navio em direção ao Mediterrâneo.
As malas só chegaram na véspera do embarque do navio, ainda bem pois dos males foi o menor.
A saída do transatlântico pelo Grande Canal de Veneza é um espetáculo inesquecível, pois quando o navio passa pelo meio da cidade as pessoas em terra ficam acenando e outros aplaudindo. E quando ele navegava bem ao lado da Praça de São Marco os turistas corriam até a margem e ali ficavam até o navio desaparecer na escuridão da noite.
E eu tão empolgado com o Rieu e a Itália que quase esqueci da limitação de espaço que eu tenho para escrever minha crônica e por isso me obrigo a interromper esta viagem imaginária prometendo continuar a narrativa oportunamente, salvo que eu faça como o comissário de bordo, decida apagar a luz do visor do meu celular e resolva dormir ...
“Enebriado pelo som da orquestra-espetáculo de André Rieu tentei escrever episódios sobre a velha Itália, mas esqueci do pouco espaço que disponho para minhas crônicas. Deixei de contar o melhor para outra ocasião, salvo que eu esqueça e resolva hibernar.”
Edson Vidal Pinto
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