Nós, o povo brasileiro!
Hoje, 16 de janeiro, segunda feira.
Parece que nós brasileiros gostamos de ver o nosso próximo trabalhar sob um sol abrasador! É verdade. É comum ver cenas das grandes cidades de homens, com pesados macacões e capacetes prateados, entrando em pequenos bueiros, das calçadas, espremidos em posição fetal, trabalhando arduamente, e vários transeuntes parados assistindo o esforço alheio se esvair em suor. Cena patética com certeza. Parece que no íntimo alguém torce para acontecer alguma coisa imprevista, emocionante, a fim de causar alguma espécie de emoção.
E quando um expectador deixa o lugar, outro aparece para substituí-lo. Vivenciei uma experiência parecida. Na frente de casa, do outro lado da rua, um flamboyant que de há muito tinha morrido, mas que ainda dava sombra para abrigar os carros dos vizinhos para protegê-los do sol de Guaratuba. A disputa pela referida sombra era quase sempre vencida pelo oportunismo de uns e outros, porém a infeliz árvore mereceu o devido abate da Prefeitura Municipal.
A notícia alvoroçou toda a vizinhança quando o funcionário municipal veio atestar o óbito e providenciar o traslado da infeliz árvore. Da varanda pude constatar que pelo menos duas reuniões ocorreram entre o indigitado servidor público e os frustrados motoristas, meus vizinhos. Não adiantou apelar para ninguém, à decapitação da frondosa árvore tinha chegado à derradeira instância, sem nenhum ato de misericórdia. Sed lex dura lex.
E no último sábado, sem dó e nem piedade, apareceu um único homem, com uma camioneta e um reboque, para derrubar a "falecida". Sentei na varanda para apreciar. Sol escaldante! Em segundos toda a vizinhança estava presente no local. Claro que algumas famílias mais sensíveis tiraram fotografias ao lado do flamboyant, juro que vi um vizinho, ateu, com Rosário nas mãos e outro, tipo rabugento e grosso com os olhos vermelhos e lacrimejantes. Ele, sem perguntarem, dizia que estava muito resfriado.
Eu tenho certeza que ele estava mentindo. E quando todos se afastaram para uma distância segura, o homem começou o seu trabalho. Usando de uma serra elétrica ele começou desbastando os pequenos galhos e à medida que estes caiam no chão, colocava os pedaços bem ajustados, no reboque. E assim, ele prosseguiu cortando os galhos maiores até chegar ao tronco da árvore.
Pensam que alguém arredou os pés do lugar? Ninguém! Todos ficaram vendo o pobre homem se esvair no calor do meio dia. Ele fez tudo rigorosamente sozinho. E todos nós (agora eu me incluo) assistindo.
Masoquismo puro pensei eu por alguns segundos, mas estava emocionante. Próximo do tronco tinha o muro de uma das casas, a grande dúvida que existia no íntimo dos presentes, com exceção do proprietário, era saber se o grosso pedaço de madeira cairia ou não sobre aquela construção. Haja adrenalina! Nada aconteceu. O tronco caiu mesmo sobre a calçada e parte da rua.
A "poda" chegou ao fim! Os vizinhos só se dispersaram quando a traseira do reboque desapareceu ao dobrar a esquina. Neste exato momento estou olhando na direção do flamboyant que ficou na saudade. Nem uma viva alma por perto. Claro, ninguém está trabalhando para reunir a vizinhança. A rua voltou a sua monotonia de sempre.
Todos estão na praia. Mas como não sou de ferro e tenho gosto mais simples, vou deixar a minha cadeira na varanda e dar um mergulho na piscina localizada nos fundos da propriedade. Esta vida de aposentado me nauseia! Não vejo o dia para me mudar para Anchorage, no Alaska!