O Álbum de Fotografias.
Um fato da vida real. Lembro que foi em 1.968, quando eu era Promotor Substituto e fui designado temporariamente para a Comarca de Rio Negro, tendo morado num hotel daquela cidade. Certa noite quando jantava no restaurante do próprio estabelecimento fui abordado por um homem que também era hóspede e começamos a conversar.
Ele me contou que era fiscal do IBC e estava trabalhando nos armazéns de café localizados no entroncamento ferroviário da região. Conversa vai e vem ele contou que se chamava Adail e era ex-jogador de futebol do Coritiba, tendo sido goleiro do time e da Seleção Paranaense de Futebol.
Dali em diante sempre conversavam no hall do hotel e às vezes jantávamos na mesma mesa. Num certo dia ele apareceu com um álbum de fotografias embaixo do braço e disse que tinha trazido de Curitiba para que eu conhecesse a sua trajetória de futebolista.
O álbum tinha capa e contracapa de madeira, esculpida com pinheiros do Paraná, uma espécie de mimo regional que os turistas compravam na antiga loja “Lembranças Paraná”. Dentro estavam fotografias que contavam a trajetória vitoriosa do Adail, desde a Seleção Capixaba até suas últimas partidas no antigo estádio “Belford Duarte”.
Eu como Coxa Branca fiquei maravilhado com aquela relíquia e por isto ele insistiu que eu ficasse uns dias com o álbum a fim de mostrar o mesmo para meus familiares e amigos. Procurei recusar com medo de poder extraviar aquela história de vida de um atleta, mas ele tanto insistiu que acabei ficando seu depositário.
Mostrei num final de semana que eu estava em Curitiba o álbum para varias pessoas, mas logo voltei com ele para Rio Negro. Daí passaram algumas semanas e nunca mais vi o Adail no hotel. Meses depois fui designado para a comarca de Ipiranga e mudei da cidade.
O álbum eu deixei em Curitiba no apartamento de meu pai, que com o passar dos anos caiu no esquecimento. Casei, continuei como nômade morando em diversas comarcas do interior, até que em 1.980 retornei definitivamente à Curitiba com a família que constituí.
Época em que faleceu meu saudoso pai. Minha irmã mais velha foi mexer nos armários do apartamento e achou o álbum do Adail, e sem saber quem ele era perguntou se eu conhecia. Contei esta mesma história. Desde então levei o álbum para minha casa e minha esposa o guardou com todo o cuidado.
Foi já no início deste século quando eu era Juiz do Tribunal de Alçada e o presidente do Coritiba era o Dr. Jair Cirino dos Santos, meu colega do Ministério Público, que me ocorreu fazer a entrega do álbum para o Museu do Clube. Marquei um encontro com o Dr. Cirino e levei o álbum comigo e para minha surpresa quando entrei no seu gabinete ele estava acompanhado de algumas pessoas, todas elas integrantes do grupo chamado “Helênicos”.
Eram rapazes que pesquisam a história do Coritiba desde a sua fundação para registrar fatos, jogadores e personalidades que ajudaram o clube na sua caminhada centenária.
Eles me prometeram que iriam reproduzir as fotos, manter o álbum intacto e encetar todos os esforços para restituir o mesmo para o seu legítimo proprietário. Sai do encontro satisfeito e com a consciência leve. Meses depois recebi um telefonema no meu gabinete de trabalho, era um dos helênicos me informando que tinha localizado a família do Adail e que sua esposa morava em Curitiba, mas que ele falecera. E que a viúva tinha insistido que eu fosse entregar pessoalmente o álbum para ela, pois queria me conhecer e agradecer por ter preservado uma parte relevante da história de vida de seu esposo.
E os Helênicos e o Presidente do Coritiba marcaram o encontro no apartamento da viúva do Adail e eu fui entregar o álbum. Foi uma festa. Estavam todos os familiares do falecido, a esposa, filhas, genros, netos, sobrinhos e amigos. Foi emocionante quando a viúva pegou o álbum apertou o mesmo em seu peito, me abraçou e chorou copiosamente.
E cada folha que era virada as filhas mostravam para seus filhos como era o avô no esplendor de sua juventude. Não sei por que levei tantos anos para contar esta história; pois acho que ela bem mereceria ser escrita por ser diferente e repleta de muito amor e saudades...
“Quem não tem o retrato de alguém dentro do próprio coração? A fotografia é o registro fiel de instantâneos que retratam os momentos de uma vida. Imagine o valor de um álbum repleto de fotos de uma pessoa amada que vive em outra dimensão? Vale como relíquia de valor inestimável!”
Edson Vidal Pinto