O Circo
Lembro como se fosse hoje quando eu morava na casa de meus pais na rua Des. Mota, entre as Avenidas Iguaçú e Getúlio Vargas, quando na Praça Afonso Botelho em frente do Estádio Joaquim Américo do então Clube Atlético Paranaense chegaram gigantescos caminhões jamanta transportando equipamentos para a montagem do “Circo Orlando Orfei” ; e logo depois uma frota de caminhões menores trouxeram jaulas com dezenas de animais e trailers que serviam de dormitório para empregados mais graduados.
Os artistas ficaram instalados em hotel da cidade. A praça que era um campo gramado e aberto serviu para abrigar a totalidade do circo que depois de instalado e montado tornou-se uma atração do bairro.
Assisti do alto do morro porque a praça era mais baixa do que as ruas toda a montagem das lonas que serviam de cobertura e o vai e vem incessante de tratores e operários que trabalhavam para armar o gigantesco circo de três picadeiros.
Vi o Sr. Orlando Orfei coordenando e fiscalizando a montagem sempre atento e corrigindo as imperfeições numa disposição invejável. Era um homem de meia idade, grandalhão e com farta cabeleira de cabelos grisalhos que além de empresário era o domador de tigres e leões e o músico que comandava as famosas “águas dançantes”.
Num arroubo de alegria escrevi numa folha de caderno que guardo até hoje:
“O circo chegou
o bairro animou,
o leão rugiu,
o pequeno assustado
Chorou
então o pai sentiu
lembranças de criança
que o tempo apagou …”
Fui em três sessões diferentes porque sempre gostei de assistir os espetáculos circenses e depois de adulto continuei levando minha mulher e filhos porque nada se iguala com o cheiro do cepilho no chão, as luzes, os trapézios, os animais, o mágico, os equilibristas, os palhaços e o globo da morte. Também assisti “O Circo Garcia”, “Circo Thiany”, “Circo Stankkovich”, “Circo Vostok” e o “Circo de Soleil” entre outros mais modestos e com menos requinte que vieram à Curitiba.
Só não assisti o “Circo Queirolo” quando estava no auge, mas dele fiquei sabendo por intermédio de meu saudoso pai que me contou que ele foi armado na Praça Carlos Gomes e ocupou toda a sua extensão, com apresentações espetaculares, animais selvagens e com artistas vestidos com trajes impecáveis.
A principal atração era o famoso palhaço Chic-Chic com sua impagável cadela de pano chamada Violeta e sempre acompanhado de seu fiel amigo Espingarda, que arrancavam gargalhadas da platéia. E no trapézio se apresentavam os “Cinco Diabos Brancos” todos da família Queirolo que faziam o famoso “salto triplo” que era o ponto alto do espetáculo.
Com o surgimento do cinema e a expansão do teatro o circo foi perdendo seu público e minguando de tamanho. Para sobreviver tiveram de viajar mais em busca de novos públicos quando então, no Brasil, adveio a proibição de exibirem animais que eram temidos e amados ao mesmo tempo pelas crianças e os adultos. Assisti o “Circo Queirolo” quando funcionava em bairros da cidade, com lonas em frangalhos e apresentações de espetáculos teatralizados até deixar de existir.
O circo é uma arte popular que está em extinção e que sofreu com a pandemia da COVID pela proibição de quase dois longos anos sem poder dar espetáculos.
E assim, aos poucos, o “maior espetáculo da terra” - o circo - acabará vivendo apenas na memória de alguns poucos, sem que as crianças de hoje tenham a oportunidade de conhecer o palhaço (que é ladrão de mulher), de ver de perto o elefante sendo montado por uma bela jovem, o tigre obediente ao seu domador, o contorcionista se transformando em sapo e nem o trapezista fazendo piruetas até cair na rede de segurança e depois descer dela para receber os aplausos.
A modernidade roubou o circo tradicional porque os brinquedos eletrônicos fizeram as crianças esquecer de rir, brincar e conhecer o lado mais inocente da vida …
“A vida são momentos em que as pessoas devem aproveitar para não se arrepender. Pois os momentos são únicos e não voltam mais. Lembranças são momentos que guardamos dentro de nós.”
Édson Vidal Pinto