O fim de um sonho
Um dia o brasileiro de bem acordou com a notícia de que gente de colarinho branco e empresários endinheirados foram flagrados pela Polícia Federal num festival de propinas e metidos na corrupção até o pescoço, um escândalo até então nunca visto no país, fato inédito porque a Justiça Criminal se prestava para punir, na grande maioria, pés de chinelos. E no meio deste redemoinho pairava como estrela principal nada mais e nada menos do que trambiqueiro Luiz Ignácio, ex-Presidente da República e exímio encantador de inocentes úteis. O impacto da notícia estremeceu o mundo político e econômico tendo Petrobras sido o carro chefe, empresa esta dilapidada e manejada criminosamente por seus dirigentes, com prejuízos significativos aos seus acionistas e aos cofres do Brasil. Neste emaranhado de desvios e remessas de milhões de dólares para o exterior não poderia faltar a figura de José Dirceu, outro trambiqueiro de canhota sempre afiada, disposto a afrontar o Estado Democrático de Direito. E dos empresários envolvidos surgiu a família Odebrecht dona de uma das maiores empreiteiras da América do Sul, que corrompeu meio mundo para auferir somas milionárias com empreendimentos fora e dentro do país. Com tais notícias houve um fio de esperança que a orgia entre os criminosos envolvidos estaria prestes a acabar, o Brasil seria passado a limpo.
O furacão foi apelidado de “Operação Lava Jato” fazendo ressurgir a Justiça Federal no cenário jurídico e o aparecimento de Juízes e Promotores como salvadores da Pátria. Dentre estes os dois principais - Sérgio Moro e Deltan Dallagnol - os heróis de uma nova era para regozijo dos bons brasileiros. Todavia apareceu em cena o STF e logo um confronto aberto foi instaurado entre os responsáveis pelos processos e os inquilinos daquela derradeira Instância do Poder Judiciário. E como o galho sempre quebra do lado mais fraco , o Moro pediu exoneração do seu cargo para uma aventura na área do Poder Executivo onde se deu mal, para, finalmente entrar na política partidária onde está Senador da República; e o Deltan, perseguido dentro de sua Instituição, também pediu exoneração do cargo de Procurador da República e optou ser candidato a deputado federal, sendo eleito com expressiva votação. Perseguido acabou sendo cassado pelo TSE , numa decisão fantasmagórica, estando presentemente na berlinda. Outros Juízes e Promotores federais que atuaram nos processos da “Lava Jato” foram afastados das funções ou exonerados, pelos famigerados Conselhos que dirigem e mandam nos Tribunais e nos Ministérios Públicos. Em paralelo o STF acatou a incompetência de foro e a suspeição do Moro para anular os processos, inclusive aqueles que condenaram o Luiz Ignácio.
Este foi ungido a Presidente da República. E aos poucos outros processos foram anulados e seus condenados ressuscitados. A Procuradoria Geral da República, porque o Bolsonaro fez um pacto com o Centrão para garantir a sua governabilidade, aos poucos foi enfraquecendo a “Lava Jato” que se tornou um arremedo do que foi. E anteontem, enquanto o Moro foi mantido como Senador eleito, o Odebrecht ( o Marcelo que confessou detalhes dos crimes ) teve seu processo anulado, e o José Dirceu teve há seu favor a declaração de prescrição de uma ação penal tardiamente proposta. E assim, por todas as falcatruas, omissões, favorecimentos e benesses concedidos aos delinquentes, o sonho de um Brasil diferente bateu na trave, o gol não saiu, mas os gandulas foram punidos…
“Este o retrato cruel do que aconteceu com a “Operação Lava Jato” e seus arrojados profissionais da lei, todos perseguidos de uma forma ou de outra, por causa de seus erros e acertos. E o sonho de passar o Brasil a limpo dos corruptos e políticos trambiqueiros, acabou na lata de lixo. Hoje os réus é que mandam, a Justiça padece, e a democracia perde a força.”