O toc toc do tamanco
Tem dias que levanto nostálgico e lembro passagens de minha infância, da imagem serena e carinhosa de meu avô paterno Gustavo Vidal Pinto filho de portugueses, porém nascido em Antonina. Vovô viveu a maior parte de sua vida no mar, dedicou-se a Marinha Mercante antes e depois que sua esposa Hanna Maria (minha avó) faleceu quando nasceu meu pai, só retornando para sua terra natal depois que sentiu o peso da idade. Ele faleceu quando eu tinha nove anos de idade mas lembro de seu carinho para comigo, do jeito que ele fazia na plataforma da estação ferroviária quando o trem chegava e ele me puxava pela janela, apertando-me nos seus braços. Ah, que saudades! E todas as vezes que íamos visitá-lo e ficávamos em sua casa dois ou três dias, a cena da estação se repetia e por toda minha vida lembro do abraço carinhoso de meu avô. Ele morava atrás da Igreja de São Benedito em uma casa de material cuja frente dava para a calçada e a porta de entrada ficava dia e noite aberta. Sinal dos bons tempos. E como um velho marujo meu avô tinha dois papagaios, ambos falavam de tudo, um deles se chamava “Vovô” e era velho e temperamental. Vivia preso com uma corrente no pé que estava afixada em seu poleiro, pois solto quando ele não gostava de uma pessoa ele atacava e queria bicar. Não gostava de provocação e muito menos da letra da música de carnaval “Nega Maluca”, quando alguém cantava ele eriçava as penas e dizia palavrões. A casa era simples, mas muito bem arejada, com fotos de meus bisavós pendurados na parede, bem como do meu pai e da minha mãe. Meu pai era filho único. A cidade de Antonina era toda ela de paralelepípedo, com casarios antigos, a praça principal com o seu coreto, rodeada de árvores e bancos, entre os jardins. Numa área elevada está a Igreja de Nossa Senhora do Pilar, a Padroeira, com a porta da frente voltada para o mar de onde os moradores rés e turistas podem enxergar ao longe os contornos do Porto de Paranaguá. Um passeio imperdível continua sendo a Ponta da Pita com seus bares típicos e sua prainha para um bom banho de mar. Do iate clube muitos barcos e veleiros saem e voltam depois de fazerem manobras na baía, com alguns pescadores praticando seus esporte prediletos, ou em visita às ilhas mais próximas.
A beleza da baía de Antonina , para quem gosta do mar, é inesquecível. Nos velhos tempos o Mercado Municipal era agitado, com canoas chegando de todos os lados, repletas de peixe, camarão, palmito, laranja, mimosa, cana de açúcar e melado. Era um tal de vender e comprar sem parar. Também tinha um canto reservado para o comércio de ostras, podendo seus apreciadores comerem as mesmas, salpicadas por gotas de limão espremido com as mãos. Tinham carrinhos de garapa espalhados ao redor do Mercado, tudo com muita higiene e cuidado, fiscalizados por funcionários da Prefeitura. E tinha também o melhor bolinho de camarão feito com muito esmero nas bancas do Mercado. E claro não faltavam os bolinhos de banana da Terra e os pastéis. Ao lado do mercado o trapiche de madeira avançando em direção do mar. Um espaço que os turistas curtiam e os rapazes da cidade diziam de trampolim para mergulharem n’agua. E como reflexo da tradição portuguesa tinha os tamancos de madeira, calçado obrigatório dos pescadores pela facilidade de calçar e tirar quando precisavam colocar os pés na água do mar. E muitos pescadores colocavam os peixes em balaios de vime que eram transportados no ombro, por duas pessoas, pendurados pelo remo da própria canoa, para serem vendidos por toda a cidade. Lembro até hoje do toc, toc, toc, dos tamancos numa sinfonia cadenciada e que mais parecia um sapateado dos homens do mar. Esta a Antonina do tempo de meu avô, uma pequenina pérola encrustada no litoral do estado, repleta de histórias e de gente simplesmas que ama sua terra, tanto quanto ama o mar…
“É difícil falar de Antonina sem lembrar a Fonte da Santa, a Maria Fumaça, o Morro do Bom Brinquedo, o Bairro da Graciosa, a Banda de Antonina, o bloco dos Apinajé, a Casa do Sr. Winther e o Velho trapiche de madeira. Foi o primeiro porto do Paraná. Uma terra de gente forte, hospitaleira e feliz.”