Os Bobocas
Há trinta e cinco anos atrás o então Procurador-geral de Justiça do Estado do Paraná o saudoso dr. Jerônimo de Albuquerque Maranhão, instituiu na Comarca de Curitiba o Serviço Especial de Defesa do Consumidor (SEDEC) plantando um dos mais importantes serviços que o MP poderia propiciar ao povo em geral. Na época não existia o Código de Defesa do Consumidor e tudo que se fazia para defender o lado mais fraco da relação consumerista estavam distribuídas em mais de quinhentas leis esparsas que não permitiam o devido manuseio e compreensão.
Elas eram difíceis até de serem localizadas para serem aplicadas nos casos concretos. Com o advento da Lei 7.347/85 que instituiu as Ações Públicas para as defesas dos Valores Culturais, Artísticos, Paisagísticos, Turísticos, Meio Ambiente e Defesa do Consumidor motivou de pronto a criação do serviço referido. A rigor no que tange aos consumidores foi previsto no art. 50, parágrafo único, de que todo o acordo celebrado (entre o prestador de serviços e o consumidor), desde que referendado pelo agente do Ministério Público, valeria como título executivo extrajudicial. Portanto cabia ao Promotor de Justiça referendar (homologar) com sua assinatura a aludida avença, adotando as formalidades da legislação civil, para dar executividade ao novo título.
Na época eu era o Promotor titular da 1a. Vara Criminal e fui escolhido pelo Procurador-Geral para ser o primeiro Promotor de Justiça da Defesa do Consumidor no Estado do Paraná. Portanto tendo recebido as chaves de uma casa alugada para instalar o novo serviço, contando com auxílio de apenas dois funcionários e de um veículo Volkswagen, sedan, declarado inservível pela Polícia Civil, iniciamos no estado os trabalhos de Defesa dos consumidores. Não existia o Procon e o governo estadual colocava à disposição dos consumidores a CODEC (Coordenadoria Estadual de Defesa do Consumidor), um setor mais de orientação publicitária, porém sem nenhuma objetividade prática. Não demorou para que o SEDEC cooptasse e desse um feitio parecido, inclusive para que fossem realizadas audiências similares para eventual celebração de acordo entre as partes envolvidas.
Só que faltava para a CODEC o devido escoro legal para que seu acordo valesse como título extrajudicial, o que tornava inócua a validade de suas avenças. Assim, enquanto a produtividade dos serviços da Promotoria crescia assustadoramente aquele do governo estadual permanecia estática, mesmo após com a nova formatação do PROCON.
Anos depois foi criada por Lei a Promotoria de Defesa do Consumidor que passou a promover apenas as ações públicas de defesa dos consumidores, cabendo ao PROCON realizar os acordos entre os interessados. E foi só em janeiro de 1.991 que o Código de Defesa do Consumidor passou a vigorar em todo o território nacional, facilitando muito o trabalho dos operadores do direito e conscientizando os consumidores das medidas que lhes são protetivas. Apesar de decorridos trinta anos do CDC falta muito ainda para uma conscientização acerca da importância desta lei para a harmonia das relações consumeristas. Exemplo? A inflação crescente e a burla no comércio alimentício. Como? Basta fazer compras em supermercado e deparar com um meio habitual de querer enganar os consumidores.
Os fabricantes mantêm o mesmo valor do produto colocado à venda, todavia diminuem a sua quantidade, facilmente notado nos pacotes de bolacha. Mas não ficam apenas nestes produtos como também outros dos mais variados tipos compreendendo desde o peso das pastas de dentes até o tamanho de sabonetes e assim por diante. Para o consumidor menos atento a inflação parece que sobe pouco e não se dá conta que a mercadoria comprada diminuiu de tamanho, peso ou quantidade.
E isto não caracteriza lesão ao direito de quem compra? Eis uma questão que mereceria a devida reprimenda protetiva ou um esclarecimento razoável de que não se trata de má-fé do fabricante. Fica aqui lançada no ar a sugestão que poderá servir de mote para comemorar os trinta anos CDC. Afinal os consumidores não são tão bobocas como podem parecer ...
“Eu não aumento o valor do produto que fabrico, mas diminuo o peso, a quantidade e o tamanho. Isto não é uma burla para enganar o consumidor? O pão de água está diminuindo a olhos vistos com possibilidade no final do ano que vem estar do tamanho de uma bolacha Maria. Alguma coisa não está muito certa, você não acha? Ninguém engana ninguém?”
Edson Vidal Pinto
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