Os Maravilhosos Bichos da Nossa Secretária
Quem conhece a empregada doméstica que minha mulher suporta há quase vinte e cinco anos, com certeza poderá confirmar que tudo que vou escrever é verdadeiro e sem um único pingo de exagero. Não lembro mais como ela acabou trabalhando para nós, - só sei que veio lá dos fundos da cidade de Cascavel (Pr.), apesar de falar alto, com autoridade de guarda urbano, sem papas na língua, forte como uma tora, mas tem um coração de criança.
Foi casada, apanhou muito do marido, tem um filho, hoje já adulto, vive sozinha e rodeada de seus amados animais. É deles que vou me reportar em flagrantes recheados de jocosidade. Os animais?
Ah, o “Luiz Eduardo” é um puro vira-lata, multicolorido, resgatado da rua e com a “mãe” que tem leva uma vida de “rei”. Flagrei um dia destes ela contando para minha mulher que estava dentro do ônibus no mesmo horário que as domésticas voltam para suas casas, quando duas delas conversavam sobre as “artes” de seus filhos menores.
Ela não resistiu e falou:
- Eu tenho o “Luiz Eduardo” que me dá um trabalho danado ...
- Por quê? - perguntou uma delas.
- Ele anda pela vizinhança toda e sempre encontra alguém para brigar ...
- Nossa, ele é brabo?
- E como - respondeu de pronto a nossa secretária.
- E você não educa?
- Educar eu educo, mas cansei. Ele chega todo mordido em casa e eu digo para ele: “bem feito!”
Nesta altura todos os passageiros estavam indignados com o que estavam ouvindo, muitos estavam de cara fechada.
- Bem chegou o meu ponto, vou descer aqui. Tchau, pra vocês!!
E ela então falou para minha mulher:
- A senhora sabe que ninguém me deu tchau!
- Mas você não contou que o “Luiz Eduardo” é um cachorro?
- Claro que não, se elas ficassem sabendo com certeza diriam que eu era louca!!
Num outro dia ela chegou com os olhos inchados de tanto chorar.
- O que aconteceu? - perguntou minha mulher.
- O “Dudu” caiu na gandaia e chegou em casa tão estraçalhado de mordidas que eu passei a noite toda no veterinário.
- É o que dá ter um cachorro malandro ...
- Mas de família! De família !! - e ficou zangada uma boa parte do dia.
O “Luiz Eduardo” ou “Dudu” para os mais íntimos leva uma vida que muito humano gostaria de levar, eu ousaria dizer que se fosse um personagem dos contos de fada seria um ogro que se deu muito bem na vida: é paparicado e amado como gente grande. E tem a Ivy, uma tartaruga que pertencia às minhas netas, mas quando meu filho levou a família para China, ela ficou em minha casa sob nossos cuidados. Depois da viagem a Ivy foi esquecida.
Meses depois ela foi de mala e cuia para a casa da empregada. Esta ficou encantada com a tartaruga, o aquário e toda a parafernália de aparelhos que acompanhou a mudança. E não demorou muito para surgirem histórias do cotidiano doméstico:
- A senhora sabe que quando eu chego em casa a Ivy me conhece e pede colo?
- Que bobagem.
- Não, ela bate as patinhas no vidro do aquário e eu então a coloco no meu peito.
- E daí?
- Ela fica quietinha, quietinha ...
E no outro dia:
- A senhora sabe o que faço quando estou limpando a casa?
- ?
- Coloco a Ivy no chão ...
- E daí?
- Acredita que onde eu vou eu ela vai atrás ? Ela deve ser muito carente.
Mas a melhor de todas eu ouvi ontem na hora do almoço; estávamos começando a almoçar quando a empregada apareceu e perguntou:
- Será que existe psicólogo para tartaruga?
- O que foi dessa vez ? - quis saber minha mulher.
- Ela desmonta com as patinhas tudo que tem dentro do aquário, as plantas artificiais, o túnel de porcelana, as pedras que deixo arrumadinha e até tira o termômetro do lugar!
- Ela é uma bagunceira, isso sim!
- Que nada, acho que ela está com problemas psicológicos ...
E assim todos os dias temos “novidades” do “Luiz Eduardo” e da “Ivy” duas criaturas que fazem parte da conversa diária aqui de casa, mas considerando as coisas ruins que estão acontecendo por causa do vírus chinês e notícias nada alvissareiras do custo da gasolina, eu e minha mulher estamos treinando para conviver com esse novo século repleto de maluquices ...
“Hoje em dia as pessoas falam com seus animais como se fossem gente. Não sei quem ensinou, mas que conversam, conversam. E beijar, então? Esse novo século vai “aprontar” muita coisa. Quem viver, verá!”
Edson Vidal Pinto
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