Pânico no Velho Casario
Quem nunca teve a oportunidade de assistir um só filme estrelado por Boris Karllof, ator americano que estrelou filmes de terror nas décadas de quarenta e cinquenta do século passado, com certeza nunca sentiu um friozinho na espinha e nem ficou com medo de dormir sozinho.
Ele se transfigurava nas interpretações de Frankenstein um monstro ressuscitado num laboratório por um cientista tresloucado, que com ajuda de um cenário tétrico e música de impacto fazia o público de cinema dar pulos na poltrona.
No entanto assistir os mesmos filmes hoje em dia ao invés de dar medo dá acesso de riso, pois é nítida as improvisações cênicas pela falta de recursos técnicos e improvisações rudimentares das filmagens de antigamente. Mas naquela época não tinha quem não saísse do cinema olhando para os lados, ressabiado com tudo, com medo até da própria sombra.
É interessante como este gênero de filme caiu de moda pois os seres humanos vivos é que assustam muito mais; e principalmente quando a noite encontramos numa rua mal iluminada alguém vindo em nossa direção. A incerteza do que possa acontecer nos leva a conjecturar mil situações e reações diferentes. É o medo da incerteza.
Mas é claro que muitas vezes mesmo estando dentro de casa quando chove, venta e troveja com relâmpagos ameaçadores dá um certo receio por lembrar um cenário tétrico e sobrenatural. Não é sempre, mas tem ocasiões que acontece.
Fiz esta introdução porque ontem foi dia do amigo e lembrei de um deles que se foi mas deixou saudades pela sua maneira peculiar de ser e pelo coração grandioso com que soube angariar sólidas amizades.
É claro, que também, por ter protagonizado uma cena hilariante e tenebrosa acontecida no interior de uma casa centenária, numa noite de tempestade. Este será o tema desta crônica. Meu saudoso amigo se chamava Daniel Romaniuk da Silva, filho do famoso vereador curitibano de muitos mandatos Milton Anselmo da Silva, e esposo da Ana Flora que por muitos anos foi Diretora-Geral do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, inclusive quando presidi aquela Corte.
O Daniel foi Promotor de Justiça e por conseguinte teve que morar em diversas comarcas do interior do estado como acontece com todos aqueles que ingressam na carreira, pois o aprendizado vem da experiência auferida nas trincheiras das pequenas e médias cidades.
E em uma delas morou com a mulher e um filho pequeno na comarca de São Mateus do Sul, quando alugou um casario antigo numa área pouco habitada, por ter muitos terrenos baldios ao lado da casa. O imóvel era mobiliado pelo locador e a única peça que fora levada pelos novos inquilinos foi um pequeno berço colocado no quarto do casal onde dormia o primogênito.
Este precisou de consulta médica na capital e a Ana Flora acompanhou o bebê numa rápida viagem. Foi neste período em que o Daniel ficou sozinho na casa que o ocorreu um o episódio que vou contar. Era noite de inverno, chovia a cântaros, com relâmpagos e trovões por todos os lados quando o “dono” da casa acordou com alguém batendo na porta da frente.
E ao atender deparou com um seu colega do Ministério Publico, que não vou dizer o nome por motivos óbvios. Este estava sozinho, disse que estava se dirigindo até São João do Triunfo para fazer um júri no dia seguinte, contudo a estrada com muita lama pelo tamanho da tempestade não permitiu chegar ao seu destino e por isto resolveu pedir pouso na casa de seu colega.
É claro que foi prontamente acolhido e depois que o anfitrião contou que estava sozinho naquela imensa casa indicou um dos seis quartos para o visitante pernoitar. E lá fora o vento uivava e os relâmpagos não paravam. E assim cada um foi para seu respectivo quarto. Só que o visitante não conseguiu dormir naquele casario que parecia demasiadamente tétrico. Tentou fechar os olhos mas abria quando a luz dos relâmpagos refletia nas paredes do quarto. E começou a suar e pensar no pior.
De repente bateu uma rajada de vento um pouco mais forte que arremessou a veneziana, uma peça de madeira colocada do lado de fora da janela para escurecer o ambiente, contra a janela do quarto onde dormia fazendo um ecoar um barulho ensurdecedor. E ele logo pensou que era um fantasma querendo entrar no dormitório.
Sem pensar duas vezes, deu um pulo da cama e foi direto ao quarto de seu amigo, acordando-o:
- Daniel! Daniel! Acho que eu vi um fantasma!!
O anfitrião quis dar uma gargalhada mas como viu seu amigo com medo, olhos arregalado e assustado, respondeu:
- Não seja bobo. Nessa casa não tem fantasma…
- Eu acho que tem. Posso dormir no teu quarto ?
- Só não na minha cama, está bem ? - respondeu o Daniel.
- Deixe que eu me viro.?Dormirei no chão!
E assim passou a noite e o dia seguinte amanheceu com réstias de sol entrando pelo quarto onde tinham dormido os dois “homens da lei”. O primeiro que acordou foi o Daniel que viu seu amigo e colega, todo espremido , dormindo dentro do pequeno berço com as pernas saindo pelas grades do móvel.
Este fato foi verídico e ficou fazendo parte da história do Ministério Público. E o Daniel não cansava de contar para quem quisesse ouvir. O visitante hoje é um dinâmico Procurador de Justiça que nega peremptoriamente o fato. Embora admita que dormiu num velho casario assombrado, em São Mateus do Sul …
“Quem nunca sentiu medo de duas uma : ou morreu ou é um grande mentiroso. Pois o medo faz parte do enredo da vida de cada indivíduo. Daí a verdade inconteste de que : “ quem tem (…) tem medo!”
Édson Vidal Pinto