Quando as Crianças Crescem.
Lembro-me de quando eu era criança e vinha para Guaratuba de carro, com meu pai dirigindo um carro da marca “Skoda”, minha mãe do lado e minha irmã no banco de trás, pela estrada compactada por conchinhas do mar entre o trecho de Garuva até chegar ao Morro do Cristo.
E quando avistava as primeiras ondas do mar a alegria era incontida, pois estávamos chegando a nossa casa de praia, de madeira, rústica, com um enorme quintal habitado por alguns lagartos que assustavam os mais corajosos.
As ruas da cidade também eram revestidas de conchinhas, com valetas de céu aberto e postes de iluminação pública que mal dava para enxergar os próprios pés. Era uma luz quase de lamparina, brumosa, de nenhuma intensidade. A maior concentração de banhistas ficava na área da praia central, toda a faixa de areia além dela se prestava para longas caminhadas, catar conchinhas, caramujos e estrelas do mar. Na bucólica baía de Guaratuba o Mercado Municipal era o ponto de encontro, pois nele chegavam às canoas de pescadores para comercializar frutos do mar e da terra.
A mimosa, laranja e a carambola eram frutos saborosos e esperados pelos ávidos compradores. Na outra extremidade estava edificada uma boate noturna chamada “Danúbio Azul” e para chegar até ela o usuário tinha que percorrer uma ponte de madeira, suspensa entre fortes pilares. Sem contar o casario velho de comércio e residências. Tempos depois essa parte ruiu, levada pela força das águas. Foi uma tragédia. O comércio era insipiente, a energia elétrica insuficiente e a água artigo de luxo.
Era na bica da Santa que as famílias enchiam os garrafões de água potável para consumo; nesse local formavam extensas filas e serviam para as pessoas se conhecerem. Conversas triviais, quase sempre um tímido cumprimento, nada mais. Era o típico jeito dos Curitibanos.
A praia depois do Morro do Cristo em direção a São Francisco Sul - SC era considerada de mar revolto e ninguém se atrevia tomar banho. Era uma região inóspita e deserta. Alguém teve a iniciativa de lotear um trecho um pouco mais distante e denominou de “Balneário Eliana”, foi um empreendimento que fracassou. Pouca gente aderiu à propaganda.
E temporada de praia mesmo só nos meses de dezembro, janeiro e parte de fevereiro, depois disso a água gelada espantava os banhista. Salvo aquelas pessoas que eventualmente desciam para o litoral e não poderiam perder a oportunidade de se “salgar”. Guaratuba tinha as características de um típico balneário, com casas de veraneio e poucos moradores fixos, o fluxo maior de pessoas ficava sempre reservado para o período de temporada de verão. No inverno além da água fria o vento do mar era cortante e afastava qualquer um da beira mar.
Eram as crianças que melhor aproveitavam tudo que Guaratuba oferecia: andar de bicicleta pelas ruas de quase nenhum movimento de carros; brincar na areia fazendo castelos, pontes, desenhos com a ponta de um galho seco, e com baldinho tirar a água do mar para encher um buraco onde o líquido desaparecia. Eram os únicos momentos que ficavam na lembrança para serem contados aos amigos da escola. A convivência familiar era muito próxima e os adultos davam atenção às crianças.
A modernidade fez com que tudo isso acabasse. Os filhos pequenos ficam nos cantos absortos em seus jogos eletrônicos, os adultos são impacientes e preferem ficar nos seus próprios espaços, cada um vai a praia na hora que entender conveniente. A cidade de Guaratuba cresceu, alcançou a região longínqua do “Balneário Eliana”, surgiram supermercados, comércio mais intenso, ruas asfaltadas e toda a orla sempre lotada de banhistas.
Sem contar que os filhos adultos sumiram, constituíram suas próprias famílias, têm seus amigos de preferência e nem sempre podem vir a praia em razão de seus múltiplos afazeres. E os netos aparecem só esporadicamente. Talvez por tudo isso é que as vezes dá saudades quando os filhos eram pequenos e orbitavam ao redor de nossos próprios espaços; como éramos felizes e não sabíamos...
“Lembrar é um exercício mental que traz à tona imagens de um passado que ficou gravado na memória. Nem tudo é um mar de rosas. Mas serve de pergaminho para ser decifrado, apesar das falhas naturais e equívocos, quando estamos carregados de saudades!”
Edson Vidal Pinto