Quando o Coração Entristece.
Tem pessoas que conhecemos e que são especiais porque elegemos como amigo de verdade. Somos nós que escolhemos e preservamos como um tesouro porque nos sentimos bem na sua companhia e somos correspondidos. É engraçado pensar sobre isto porque a amizade brota espontaneamente, às vezes só por empatia, nada mais.
E com o passar do tempo nós a conservamos dentro de uma fictícia redoma de cristal imune a qualquer ofensa, intriga ou mal entendido. As vezes nos enganamos com uns e outros por varia motivos, pois nem sempre a confiança e o respeito ficam perene no relacionamento, daí surge o inevitável desencontro e o consequente distanciamento. Isto acontece quando pensamos ter encontrado um amigo e logo percebemos que nos enganamos.
Pois amigo é alguém tão difícil de encontrar como uma agulha no palheiro. Posso dizer com certeza absoluta que tenho ótimos amigos e quando alguma coisa coisa acontece com qualquer um deles, meu coração sem querer entristece. E hoje estou triste. Meu querido amigo de quase cinquenta anos Félix Fisher, está hospitalizado em Brasília em estado grave motivado por uma embolia pulmonar.
E eu aqui de longe sem deixar de pensar na sua enfermidade, rezo com todas as minhas forças por sua recuperação. Ah, meu Deus como é bom ter amigos que nos dão força para vencer as vicissitudes da vida e transpor os obstáculos que surgem no caminho; são eles que nos confortam, inspiram e dão suas mãos para levantar quando caímos.
Conheci o Félix quando ainda éramos Promotores de Justiça, eu militando no interior e ele embora mais novo na carreira estivesse designado no gabinete do Procurador-geral, mercê de sua alta competência e reconhecido emérito como jurista. Nossos encontros sempre foram alegres e jamais tivemos qualquer divergência pessoal que pudesse deslustrar nossa amizade.
E nos identificávamos pela operosidade de nossos trabalhos, cada qual dando profissionalmente o seu melhor, com produtividade e qualidade reconhecida pelos nossos superiores. Eu sempre na trincheira e ele estrategicamente junto ao alto comando da Instituição batalhando nos recursos complexos e formais manejados perante os Tribunais Superiores.
Nossos encontros aconteciam nas férias, nos Grupos de Estudos, nos Simpósios de Direito e nas festas de nossa associação de classe. E com o passar dos anos chegamos à solenidade de posse de nossas promoções ao cargo de Procurador de Justiça, participando do mesmo ato público. Eu mais antigo na carreira e ele reconhecidamente um conceituado jurista.
Quando fui Secretário de Estado da Justiça o meu amigo Félix Fisher concorreu ao cargo de desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná, embora oficiosamente nomeado pelo governador Jaime Lerner, sofreu uma sórdida rasteira urdida pelo então todo poderoso Aníbal Khoury tendo sido preterido na sua postulação.
Chorei com ele a dor da derrota. Tempos depois Deus abriu uma janela quando no STJ vagou um cargo de ministro da Corte, para ser preenchido por um agente do Ministério Público estadual. E com todos os méritos o Félix se inscreveu para a vaga, obtendo a promessa do governador Lerner que daria apoio político incondicional do Paraná para ele poder alcançar aquele intento.
E como seu Secretário de Justiça fui incumbido de organizar e orquestrar junto à comunidade paranaense através de seus órgãos representativos o indispensável apoio à candidatura de Felix Fisher, meu amigo do coração. E não medi esforços, pois fiz do meu gabinete o “comitê” de campanha e acompanhei o Felix na sua peregrinação em Brasília.
A bancada política do Paraná no Congresso Nacional, liderada pelo senador Flávio Arns, articulou-se e se fez presente quando visitamos o então Ministro da Justiça Nelson Jobim, pedindo o seu indispensável apoio. E ele surpreso com a força política do nosso estado acabou aderindo a pretensão do Paraná. E assim conseguimos sobrepujar o principal candidato paulista ao cargo, o Prof. Nelson Nery. Daí a nomeação foi uma questão de tempo.
No Senado coube ao Roberto Requião a relatoria quando ocorreu a sabatina. E a posse do Ministro Félix Fisher foi festivamente comemorada pela comunidade jurídica e pelas entidades representativas do Paraná. Em pouco tempo ele tornou-se um dos nomes respeitados do STJ, foi seu presidente e atualmente é o seu decano. Jamais se esqueceu dos amigos, do nosso velho Ministério Público e de nosso querido estado, embora tivesse vivido sua juventude no Rio de Janeiro, onde se formou na Universidade do Brasil e tivesse nascido na cidade de Hamburgo, na Alemanha.
Mas é mais brasileiro e paranaense como muitos dos que nasceram por aqui. E nas suas férias forenses jamais deixaram de vir a Curitiba quando nos encontramos e confraternizamos com nossas famílias e outros amigos comuns que nos são caros. Quando soube de sua doença meu combalido coração chorou. Nossas idades já não permitem doenças perigosas, mas nem por isto perdemos a esperança porque confiamos sempre em dias melhores.
Afinal, sempre fomos guerreiros quando trabalhamos e enfrentarmos a vida, jamais esmorecemos e nem perderemos a fé Naquele que nos fez chegar onde chegamos...
“Quando um amigo do coração adoece parece que a tristeza chega de mansinho e não quer ir embora. Então primeiro peço a Deus que Ele dê o necessário conforto para os familiares que estão sofrendo ao seu lado. E depois, rogo que Ele nos proporcione a chance de nos reencontrarmos brevemente, ao redor de uma mesa farta e festiva, junto com nossas famílias e amigos que queremos bem!”
Edson Vidal Pinto