Subindo o Everest.
Na minha adolescência ser escoteiro era participar de aventuras e vivenciar a natureza. Nem todas as mães permitiam que seus filhos pudessem acampar viajar e escalar longe de seus olhos, nem sentir frio e se encharcar na chuva.
A vigilância era severa e o que o escoteiro fazia longe de suas vistas era um mistério. Entrar em uma tropa era um privilégio para poucos. Eu fui um destes ungidos, não por que minha mãe não fosse à matriarca da família e possessiva com os filhos, mas porque consegui vencer a sua resistência. Minha vida escoteira dos dez aos vinte e um anos de idade (época em que conclui a Faculdade de Direito) me fez vivenciar experiências de vida que moldaram minha maneira de ser e agir.
Aprendi a respeitar as pessoas, civismo, lutar por um lugar ao sol, buscar saída para as minhas próprias dificuldades e a importância da família. Foi uma escola incomparável de convivência e amor a Deus e a Pátria. A modernidade, opções mais confortáveis e o relaxamento dos hábitos e costumes, permitem que os jovens tenham hoje em dia caminhos diferentes para percorrer em suas juventudes.
Naquele meu tempo a única maneira de dormir fora de casa ou era dormir na casa dos avós, dos tios ou na barraca de escoteiro. E os momentos foram inesquecíveis. Participei de grandes acampamentos no Rio Grande do Sul (Canela e Viamão), Rio de Janeiro (Ilha do Fundão), São Paulo (Piracicaba), Santa Catarina (Lages e Joinville), Paraguai (Lago de Ypacarai) e em várias cidades do nosso estado (Foz do Iguaçu, Matinhos, Telêmaco Borba e Londrina).
Trem e ônibus eram os meios de transportes, por serem os mais baratos. Nosso acampamento nas imediações de Curitiba era na estrada de encanamento que ia para Piraquara, em um campo ao redor da caixa d’água; no chamado Km 4 ( Parque Barigui!) e Km 8 (em uma chácara do “Nono” em Santa Felicidade e também na chácara do Sr. B. Antunes de Oliveira. Minha tropa de escoteiros era a “Jorge Frassatti”, então sediada no prédio paroquial da Igreja do Senhor Bom Jesus, da Praça Ruy Barbosa.
Os frades Franciscanos eram nossos amigos inseparáveis e jogávamos futebol com eles, em um campo improvisado atrás da Igreja. E as escaladas? Só para os maiores de quinze anos, os “escoteiros seniores” é que poderiam subir o Marumby. E não era fácil. As viagens de trem até a estação do Marumby eram divertidas e compartilhadas com os demais passageiros. Montar barracas ao redor da estação férrea, enfrentar a garoa, umidade, chuva e as “butucas” não era nada bom.
Mas o espírito de aventura superava todas as dificuldades. Subir a montanha, esbarrar na vegetação molhada, despender um esforço enorme para superar as partes íngremes apoiados em grossas correntes de ferro, exigia atenção e perseverança.
E alcançar o topo da montanha de 1.800 metros acima do nível do mar, até o Olimpo ou o Abrolhos, era o momento de ficar mais perto do Criador. “Quem uma vez sequer tenha entrado no espírito das montanhas, dificilmente se afastará delas; pois o amor das montanhas é tão forte no montanhista, como o amor ao mar pelos marinheiros”. (Rudward Kepling).
É por isto que os grandes montanhistas arriscam suas vidas para poder chegar ao cume do mundo: o Everest. Aventura para poucos. E quem não tem noção e fibra para escalar o seu “Everest” interior, dificilmente alcançará o objetivo de poder viver bem e desfrutar do prazer de viver.
Todos nós temos dentro de nós um pouco de escoteiro, basta querer vivenciar as boas aventuras da vida e ter vontade de vencer os obstáculos do caminho para poder alcançar nosso próprio Nirvana. Pois a vida é uma eterna escalada, com mil dificuldades para serem transpostas, basta acreditar que tudo é possível, até ser feliz muito feliz...
“A felicidade está bem próximo de nós, contudo, para alcançá-la temos que subir nossa própria montanha. E para isto, não basta apenas querer, mas dar o primeiro passo sem parar até alcançar o seu topo. Assim é a vida; um teste de resistência, resignação e muita força de vontade.”
Edson Vidal Pinto