Tempos Modernos.
Ontem, 12 de fevereiro, domingo.
Sai bem cedo para caminhar no Parque Barigui, logradouro tão próximo de casa que não posso deixar de desfrutar. Eu simplesmente "adoro" andar e fazer exercícios. Principalmente quando estou deitado sonhando.
Pois bem, nem tinha acabado de percorrer os 300 metros da pista e logo encontrei meu amigo Bonifácio que vinha em seguido contrário.
Fazia tantos anos que eu não o encontrava que valeu a pena: ele exultou de alegria:
- Cara, que prazer! Pensei que você tivesse morrido! Graças a Deus, que não!
Pombas! Pensei comigo mesmo, que maneira de cumprimentar um velho conhecido, mas não deixei por menos:
- Amigo alegria toda minha, pois eu juro que tinha lido no jornal o aviso de sua família convidando todos os seus amigos para a sua Missa de Sétimo Dia !
Ele deu um gostosa gargalhada e comentou:
- Cara, só faltou o anúncio necrológico! Eu morri, mesmo!
- Ah! Sei...
- É quase verdade: minha vida passada morreu, pois agora sou gay!!
Fiquei surpreso com a confissão. Não é verdade, não pode ser verdade, pois o Bonifácio era o rei da paquera, um inveterado mulherengo e macho sem nenhum resquício de suspeita. Como pode? Pô é o fim do mundo mesmo!
- Desculpe-me, sei que foi uma confissão desnecessária, pois afinal você é meu amigo e eu não precisaria mentir...
- Mentir? Eu não estou entendendo o que você está dizendo!
- Não se preocupe. Eu vou contar a verdade. Eu não sou gay coisa nenhuma, acontece que tive que assumir o que não sou para não perder meu emprego...
Eu não estava conseguindo assimilar aquela conversa que não tinha o mínimo sentido. Dai então o Bonifácio esclareceu o ocorrido.
- Você sabe que eu me formei em engenharia mecânica, não sabe?
- Fiquei sabendo...
- Pois é, fui trabalhar em uma fabrica de automóveis na Grande Curitiba onde estou há mais de dez anos.
- ??
- Acontece que há três anos a empresa resolveu demitir dezenas de funcionários, o diretor de pessoal, meu amigo, me contou que eu figurava na lista de demitidos...
- E o que tem que ver uma coisa com a outra ? Indaguei.
- Tudo! Pois virei gay!
-??
- Claro, para não ser demitido! Passei a comentar pelos corredores que se eu perdesse o emprego era por pura discriminação e perseguição contra os gays. Ameacei que a "comunidade" reunida iria protestar no portão da montadora e fazer o maior "barraco" na Imprensa.
- E dai?
- Foi o suficiente para inibir a multinacional cujos diretores receosos com a repercussão de minha demissão e boicote nas compras dos veículos da marca optou por me manter no emprego!
- Bonifácio, você é um gênio! Arrematei.
- Pois é, a única desgraça é que tenho de dizer para todo o mundo que eu sou gay. ! Senão eu perigo ser demitido. E o pior: estou desfilando até no bloco das Vadias usando calça preta de couro, com janela "nos fundos”!
Que situação a do Bonifácio, fiquei chocado. Trocamos mais algumas palavras e cada qual prosseguiu seu caminho, andando em direções opostas. Não esqueci mais o que eu tinha acabado de ouvir de um amigo de infância. Logo cai na real. Esta a verdadeira cara da sociedade em que vivemos, a tolerância se sobrepõe a tudo, ninguém pode criticar ou se revoltar com a licenciosidade que está corroendo em nossa volta.
É o sinal dos tempos. Até o maior "garanhão" que eu conheci esta se passando por gay para poder sobreviver. Aonde vamos parar? É verdade, precisamos para e pensar um pouco, não é mesmo? Dá maneira em que estamos caminhando é de se esperar que aquele dentre nós que não tiver citado o seu nome em dezenas de delações premiadas da Lava Jato, não passará de um estupido otário. E o pior: ficará com a mácula perene de ser um legítimo e imprestável "honesto”! Esta uma pequena história extraída do cotidiano que serve para distrair e refletir, num domingo sem sol e de céu cinzento. Retrato dos novos tempos, tempos tão modernos...