Toco de vela
Dia de descanso, portanto momento para distração e escrever sem preocupação, apenas o suficiente para jogar conversa fora. E como não poderia deixar de ser, encontrei o meu amigo Tucides dançando com um grupo de carnavalescos, no calçadão da Rua XV de novembro. Ele me viu e gritou:
-Ensaiando para o carnaval de Curitiba!
Credo, nem pude acreditar que meu amigo tivesse todo este entusiasmo, pois como o mundo todo sabe o nosso Carnaval é um velório. Sim, comparando com outros Carnavais o de Curitiba é uma piada sem a mínima graça. Mas, nem sempre foi assim. Nos anos quarenta e cinquenta do Século passado, de sexta a terça-feira de Carnaval, era difícil transitar pela mesma Rua XV com os foliões ocupando as calçadas e fazendo guerra de confetes, bisnagas e serpentinas com muitas fantasias, enquanto os blocos desfilavam na rua. As emissoras de rádios com seus repórteres transmitiam do início ao fim dos desfiles, tocando musiquinhas típicas nos intervalos para a alegria dos foliões. Os tradicionais clubes da cidade - Curitibano, Thalia e Círculo Militar - promoviam animados bailes para seus associados, reservando a tarde de domingo para a piazada pular nos salões, participando, também, dos festejos de Momo. O saudoso dr. José Cadilhe de Oliveira era o folião número um e com o seu bloco “Embaixadores da Alegria” não só comandava o carnaval na rua como, também, visitava com todo o seu grupo os bailes dos clubes, dando um ritmo diferente com o batuque de sua bem treinada bateria em contraste com a orquestra contrata para abrilhantar os salões. Estas paravam para os “Embaixadores” fazerem suas exibições, sob o apito estridente do seu comandante-mor. Além disto, outros dois bailes populares : o do Clube Operário e o do Clube Batel onde para entrar só os homens pegavam, eram roteiros certos para muitos casais da sociedade, disfarçados com a fantasia de “dominó” (que cobria da cabeça aos pés) para não serem identificados, pois pulavam nos respectivos salões lotados com gente de todas as classes sociais. Era uma mistura infernal e divertida. No “Operário” a atração ficava reservada para o tradicional concurso de travestis (um espanto para a época), quando na coroação final para saber qual a mais “bela” representante não faltavam chiliques, vaias e sopapos. No dia seguinte o jornal “Tribuna do Paraná” mostrava com fotos tudo o que tinha acontecido no baile, inclusive, as brigas e grande quantidade de “dominós” pulando no salão. Em outra noite, na Sociedade Batel, era realizado o desfile das “Bem Boladas” protagonizadas por moças que não eram de boas famílias, que trabalhavam em horários em que as pessoas de bem iam dormir, e em lugares alegres porém incertos e não sabidos (por poucos). Era uma zorra total quase igual ao baile do Municipal do Rio de Janeiro, com a única diferença, que lá as fantasias eram muito mais ricas. E, claro, a “Tribuna do Paraná” no dia seguinte, batia o recorde de venda. E hoje? Ah, o Carnaval virou comércio para turista ver, como no Rio de Janeiro e São Paulo; o Carnaval baiano é um produto local, insuportável e com multidões pulando atrás do trio elétrico sem nenhuma graça. Nem músicas carnavalescas de gozações existem mais, porque a sociedade ficou uma chatice, tudo é descriminação, racismo, e ódio. A nega do cabelo duro mudou de nome para Conceição, subiu o morro do Boréu e ninguém mais viu; o viado de ontem virou gay, homossexual e não admite mais ser chamado de “frutinha” porque é capaz de quebrar o pau. Daí, porquê, o Carnaval Curitibano também sucumbiu,- e não adianta o Tucides fazer força para ressuscitar o ânimo do curitibano que mais parece um toco de vela, que ilumina pouco e logo apaga. Na verdade só branco não liga de ser chamado de branquelo, flor de goiaba ou qualque coisa, menos é claro, ser chamado de ladrão. Pois este no Brasil tem nome e sobrenome, e também é chamado pelos seus de Presidente….
“Ensaiar e desfilar em bloco de Carnaval em Curitiba é o mesmo que falar em Patriotismo para Generais; pois o povo curitibano sabe que existe, os generais ouviram falar em patriotismo, só que nenhum deles sabem para que serve.”