Um Senhor Magistrado
Tenho o privilégio de ter vivenciado duas carreiras profissionais em minha vida pública e convivido em ambas com pessoas inesquecíveis. Muitos aprendizados auferidos, elegância no trato e amizades sinceras e duradouras. E agora no outono da existência lembro destes personagens que escreveram suas histórias e servem de exemplos às novas gerações de Promotores de Justiça e Juízes de Direito.
Inauguro este espaço no entremeio de minhas Crônicas para tentar preservar a Memória do Poder Judiciário do Paraná, vez que o Ministério Público cultiva há muitos anos esta feliz iniciativa. Bem se diz que o Paraná é terra de todas as gentes porque aqui vivem brasileiros de todas as regiões do país e estrangeiros que vieram em busca de melhores dias; não diferenciamos sotaques, cor, religião e nem vestimenta, pois vivemos juntos buscando sempre a melhor qualidade de vida.
O preâmbulo serve para ilustrar que o respeitável Magistrado de que trata o título desta crônica, nasceu em São Francisco do Sul - SC -, tendo concluído o Curso de Direito na UFPr. em 1.966 e ingressado na Carreira de Juiz Substituto em dezembro de 1.967, quando foi aprovado em 1o. Lugar. Foi nomeado para a Secção Judiciária da Comarca de Londrina. No ano seguinte foi nomeado em um novo concurso para Juiz de Direito, quando assumiu a titularidade da Comarca de Loanda; posteriormente, judicou nas Comarcas de Telêmaco Borba, Santa Mariana, Londrina (2a. Vara Cível) e Curitiba (18a. Vara Cível).
Foi membro efetivo do Tribunal Regional Eleitoral, professor e Coordenador da Escola da Magistratura. Em 1.990 foi promovido para o Tribunal de Alçada onde foi Vice e depois Presidente da Corte, em 2.002 foi integrar o Tribunal de Justiça do Estado onde foi o 1o. Vice-Presidente. Seu nome? Des. Onésimo Mendonça de Anunciação um cidadão na acepção do termo, um pai de família exemplar, homem temente a Deus e um amigo de verdade.
Na convivência uma criatura alegre, afável e educada. É aproveitando de sua verve humorística e observador arguto do cotidiano que conto alguns “causos” acontecidos nos ambientes vetustos dos fóruns, que ele direta ou indiretamente protagonizou.
Na Comarca de Loanda. Um tiroteio em pleno centro da pequena cidade e por motivo banal um boia fria acabou matando seu companheiro com vários tiros. O autor do homicídio foi preso em flagrante pela polícia.
No dia seguinte um advogado que não era da região peticionou requerendo a liberdade provisória do acusado. O dr. Onésimo recebeu o pedido e deu “vistas” ao Promotor de Justiça que era o dr. Francisco de Assis Pinheiro, para este dizer se concordava ou não com o pedido. O advogado com pressa para resolver o imbróglio conversou com o escrivão criminal e pediu os autos para ele mesmo levar ao Promotor, que sequer conhecia. Chegou no gabinete da Promotoria e a porta estava fechada, daí abriu a mesma o suficiente para colocar a cabeça para dentro da sala e perguntou:
- O Senhor é o Promotor por acaso?
No que respondeu enfezado o agente do Parquet:
- Por acaso não, por concurso!!!
O advogado fechou a porta e sumiu. Na Comarca de Santa Mariana. O Promotor era o saudoso dr. Paulo Bueno da Luz, que recebeu um ofício da direção da “Revista MP”
que veiculava escritos doutrinários, pareceres decisões do Tribunal de Justiça do Paraná, em cujo teor solicitava colaboração para uma nova edição da revista.
Profissional que agia sempre com rapidez no exercício de suas funções, respondeu de pronto o referido ofício com outro ofício de sua lavra e foi mostrar a resposta ao dr. Onésimo, onde estava escrito: “Colega, por favor um esclarecimento: a colaboração é em dinheiro?”. Da mesma Comarca de Santa Mariana.
Desquite amigável. Na fase preliminar de conciliação o dr. Onésimo intimou as partes e o advogado único delas, buscando um acordo a fim de colocar um fim no processo. Contudo não obteve êxito. Mesmo assim, marcou nova data para uma última tentativa. O casal e o advogado deixaram o seu gabinete. Minutos depois a mulher abriu a porta de sua sala e num tom choroso lhe diz:
- Juiz, Juiz por favor: esse advogado diz que é amigo, muito amigo, é cheio de lenha lenga, mas na verdade ele quer eu! Só eu!! E o resto não interessa . Da Comarca de Telêmaco Borba. O nego Tula era um baderneiro na cidade e muito bem quisto entre a malandragem. Nunca tinha sido preso. Um dia Tula foi testemunha de um crime e não compareceu no fórum para depor. O dr. Onésimo decretou a sua prisão por desobediência. Quando Tula chegou na cadeia encontrou muitos de seus amigos que começaram a “zoar” da presença no local. Este sem perder a pose gritou para todos se calarem, em seguida estofou o peito e disse:
- Só que vocês são presos do delegado de polícia e eu do dr. Juiz de Direito!
Este é o Des. Onésimo um arquivo vivo dos acontecimentos forenses, tudo reflexo de sua vida dedicada à Justiça do Paraná. E através desta linhas é que presto ao culto e querido amigo minhas singelas homenagens, na certeza que este seu registro na vida pública viverá para sempre na memória de muitos ...
“Época em que o Juiz era um ser sozinho, isolado, respeitado e até temido. Mas por baixo da Toga sempre pulsa um coração alegre, respeitoso e solidário. Oxalá a crise moral que envolve poucos Magistrados passe rapidamente, para a Magistratura voltar a ser respeitada pelos jurisdicionados.”
Edson Vidal Pinto
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