Uma Aventura em Canela.
Sou do tempo em que a maior alegria dos adolescentes era poder participar do escotismo -, um movimento juvenil criada pelo general inglês Lorde Baden Powell e que era uma verdadeira escola de cidadania e patriotismo -, pois muitos pais não deixavam que seus filhos pudessem ingressar em uma Tropa de Escoteiros com receio de que longe de casa pudessem enveredar por caminhos errados.
Naquela época o medo dos pais eram as más companhias e exemplos que pudessem influir negativamente na formação dos filhos. E acampar em lugares desconhecidos ou viajar com um grupo de jovens de uma mesma idade não era visto com bons olhos. Felizmente não tive este freio e encontrei no escotismo um mundo de aventuras e lembranças que guardo vivo em minha memória.
Acampei, viajei, escalei montanha, acantonei e vivi intensamente um período de minha vida que começou aos dez e terminou aos vinte e um anos de idade, no dia em que recebi meu diploma de Bacharel em Direito. Daí em diante me dediquei de corpo e alma na minha carreira profissional e o escotismo ficou para trás, como uma página virada do meu livro de vida.
E ainda hoje participo de reuniões com velhos amigos que vestiram calça curta e usaram chapéu de aba larga, agora com as famílias que cada qual constitui, para recordar e cantar as tradicionais músicas do Fogo de Conselho. Este era aceso a noite no acampamento e ao redor dele os escoteiros se confraternizavam, cantavam e apresentavam números de esquetes.
O calor do fogo aquecia os corações e a alegria da confraternização forjava bons cidadãos. Fui membro do Grupo Escoteiro Jorge Frassatti do antigo Colégio Bom Jesus, chefiado pelo Prof. Paulo de Deus Bessa e que contava sempre com as participações dos frades Franciscanos que moravam no convento anexo à Igreja do mesmo nome, na Praça Rui Barbosa.
Lembro-me de pessoas ilustres da sociedade que participavam da Região Escoteira, cito alguns: Darcy Olavo Wellner, Rodolpho Senff, Luís Silva Albuquerque, Algacir Morguesten, Gilberto Borges, Paulo Ari Gaio, Moisés Kubrusly, Joaquim Peixoto, Nicolau Obladen, Edson Guimarães, Anuar Matni e outros que a memória apagou. Pois bem, vou contar uma aventura acontecida no início de 1.960, quando então eu chefiava a Tropa de escoteiros seniores (rapazes com a idade de 15 a 18 anos) e participamos de um acampamento nacional denominado “Sênior Sul” na cidade de Canela, RS.
Estiveram reunidos quase dois mil escoteiros do Brasil e de países vizinhos que chegaram naquela bela cidade gaúcha, onde habitaram por dez dias uma verdadeira “cidade de lonas”, com ruas, açougue, frutaria, jornal diário (mimiografado), correio, hospital de campo (do Exército), lavanderia, lanchonete e livraria com intensa programação de competições mateiras e aventuras.
Nesta a principal atividade foi atravessar a noite por trás da “Cascata do Coracol”, com fachos de luz dos caminhões do Corpo de Bombeiros iluminando todo local. Mas o ponto relevante foi o desafio lançado um ano antes do evento, para que pelo menos um escoteiro sênior dentre as Tropas participantes, pudesse antes do início do conclave entregar o lenço de seu grupo escoteiro ao Prefeito Municipal. E para dificultar a Brigada Militar e os escoteiros gaúchos tinham a missão de proteger o alcaide, desmascarando os “intrusos” e prendendo o “espião” dentro de uma escola municipal.
E nós ganhamos. Tudo por que foi muito bem planejado no decorrer dos meses que antecederam o acampamento a melhor maneira de alcançar esse objetivo. E foi por acaso. No período do acampamento também estava previsto um evento paralelo na cidade, reunindo comerciários (Sesc).
Um dos escoteiros (Roberto Karam) é filho de um empresário e ele era registrado no Sesc, para poder usufruir dos benefícios da entidade. E devidamente combinado ele se incorporou na caravana de Curitiba, composta de homens e mulheres, que foram de ônibus fretado para o encontro na cidade de Canela.
A diretoria do Sesc colaborou cedendo um lugar no ônibus e registrando o Karam como participante do conclave. Foi “arranjado” uma das moças para se passar como “namorada” do mesmo e assim ele conseguiu burlar a segurança. O encontro dos comerciários aconteceu na sociedade local e contou com a presença do Chefe do Executivo Municipal. E na primeira oportunidade que teve o Karam fez a entrega do lenço da “Jorge Frassati”.
A notícia explodiu como uma bomba entre os militares e escoteiros gaúchos, pois o Paraná tinha conseguido vencer o desafio um dia antes da abertura do acampamento.
Como esquecer uma aventura como esta, não é mesmo? Quem foi escoteiro sabe muito bem o gosto de uma boa aventura; sem computador, celular, drogas e num tempo em que homem era homem e mulher era mulher e ponto final!
“O Escotismo é uma escola de cidadania e patriotismo. A disciplina nos moldes militar temperava o ímpeto e preparava os jovens para o futuro. Era uma maneira de brincar, aprendendo a servir e ser útil ao próximo”.
Edson Vidal Pinto