Vida de juiz
Quem andou anos pelo interior e enfrentou uma época de estradas de lama, barro e macadame tem sempre histórias para contar. Se reunidas daria um acervo considerável para o anedotário forense. Difícil quem não tenha sido protagonista ou testemunha presencial do ocorrido. Ou por saber de "outiva".
Aliás, um dos vícios de linguagem é empregar o termo "outiva" grafado como "oitiva" no sentido de "ouvir testemunha". O advogado requer: a "oitiva" das testemunhas adiante arroladas; o promotor idem; e o juiz despacha: designo a data de 04/09/16, às 13h30, para a oitiva das testemunhas de defesa.
Ora, outiva tem o sentido de "testemunha por ouvir dizer", ou seja, é a testemunha não presencial e que soube do fato a ser elucidado, por ouvir de terceiro. No entanto, o vocábulo passou a integrar a linguagem forense. Está consagrada. É a velha máxima: água mole em pedra dura tanto bate até que fura!
Vamos ao anedotário. Na década de 1960 um dos mais destacados nome da magistratura paranaense iniciou sua atividade judicante. Cioso de suas tarefas procurava sempre atender com presteza os advogados e os jurisdicionados. Era comum o juiz atender em seu gabinete pessoas da comunidade e seus mais diversos problemas.
Certa tarde o oficial de Justiça entrou no gabinete e informou que uma senhora de idade queria contar um problema muito sério. O juiz, educadamente, mandou a mulher entrar. Esta entrou no gabinete, chorando copiosamente e foi dizendo: Seo juiz, uma desgraça!
- O que aconteceu, senhora?
E a mulher não se fez de acanhada:
- Doutor, ganhei no jogo do bicho e o Zezinho "banqueiro" não quer pagar!
O magistrado ficou surpreso. A mulher continuou:
- Joguei no galo e deu galo na cabeça! O senhor tem que tomar uma atitude, não posso ficar no prejuízo!
O juiz pensou um pouco e respondeu:
-Minha senhora, saia daqui e vá direto conversar com o Zezinho. Diga-lhe que a senhora conversou com o juiz e ele mandou pagar a aposta imediatamente! Vá, vá rápido!
A mulher agradeceu e saiu do fórum como uma bala. E não voltou mais. O juiz até hoje está em dúvida se a aposta foi paga ou alguém explicou à mulher que o jogo do bicho era contravenção e que ela poderia ter sido presa. Dilema que perturba até hoje o desembargador Antonio Domingos Ramina. Brincadeira! Escrevi só para dar um molho na história!