Esse Maldito Celular
Ninguém duvida que o telefone celular veio para ficar e se transformou numa utilidade, as vezes mania e também um balaio de transtornos. Se por acaso você adquiriu o hábito de levar o celular no banheiro e ele tocar não atenda porque quem tiver do outro lado da linha, pelo eco do ambiente fechado que ressoa no ouvido, sabe muito bem que você está refestelado no trono e não adianta querer disfarçar. Não atenda. Não pague esse mico, depois que você terminar o que estiver fazendo pode retornar a ligação com uma desculpa qualquer.
No trânsito quando estiver dirigindo também é uma grande mancada, não telefone e nem atenda o telefone para não colocar em risco a sua e a vida de outros, pois desviar a atenção ao dirigir é sempre assumir um risco previsível. E o remorso não tem volta.
E se você por acaso é casado e um daqueles que gosta de visitar motel para saber a decoração nem pense em levar o celular no bolso, porque ele tem localizador e sabe onde você está , só não sabe com quem, mas o problemão que você arranjou estará no forno do fogão lhe esperando para ser servido quando voltar para casa. Pois o celular é um espião frio, calculista e dedo duro.
E tenha sempre cuidado para quem você telefonar ou der o número de seu telefone porque a conversa ficara registrada para quem eventualmente tiver interesse de saber o teor, principalmente se você tiver tendências lulistas porque a conversa poderá ser gravada e se você cair nas mãos da polícia poderá ganhar uma linda tornozeleira eletrônica. Outra coisa importante: não fotografe nenhuma paisagem interessante se uma moça bonita sensual e de biquíni aparecer em primeiro, segundo, terceiro ou quarto plano da fotografia, pois se sua mulher for ciumenta ela nem perceberá a beleza do cenário.
Ah, também vale lembrar que o telefone celular é um arquivo ambulante que registra toda a sua vida da hora de levantar até até a hora de dormir, com fidelidade absoluta e sem esconder a mínima privacidade. Nele está tudo registrado e se você duvidar por mais que você delete tudo que está gravado dentro dele o conteúdo vai parar nas nuvens e pode ser resgatado por quem sabe.
Claro que a sua privacidade há muito deixou de existir e tornou-se letra morta na Constituição do Brasil. Tudo bem ? Que nada não é mesmo ? Pois agora vem o pior do celular : quando você inadvertidamente toca em alguma “coisa” da tela e sem querer liga para um número qualquer.
Você fica sem ação e sem saber se vai falar ou desligar o aparelho mas de repente ouve uma voz :
- Você é o Frederico , não é mesmo ? quanto tempo hein? Está precisando de mim agora ?
E você fica sem graça e o pior sem saber com quem está falando, mas você quer dar uma de esperto e começa a falar na esperança de reconhecer pela voz quem está do outro lado da linha:
- Amigo, deixe disso, telefonei porque estava com saudades …
- Que bom, pensei que você estava brabo comigo pelo que eu te fiz …
- Brabo ? Com você ? Nem imagine uma coisa dessas pois você é mais que um amigo : é um irmão!
- ???
- pois é. E como você está ?
- Aqui na oficina trabalhando como sempre …
E você continua sem saber com quem está falando. A voz não é nem um pouco conhecida.
- pois é..
- Precisa de algum conserto ?
- ???
- Pode falar que eu estou ouvindo.
- Você por acaso faz balanceamento de rodas de carro ? Afina violão ?
Dá aulas de mandarim ? Confecciona polainas ?
- Claro que não ! Está brincando comigo, né ?
- Desculpe-me fiz apenas uma brincadeira.
- Tá, da última vez que você me telefonou eu disse que não poderia consertar a tua vitrola porque não existem mais peças, por isto achei que você ficou chateado e nunca mais me procurou.
Daí surgiu uma luz no final do túnel: Eureka. Você estão descobriu que estava falando com alguém que colocou uma tabuleta pendurada num poste de luz contendo um número de telefone que você anotou no seu celular, oferecendo-se para consertar eletrodomésticos.
Você falou com o homem uma única vez e nunca teve amizade com o mesmo.
- Você pode consertar meu gramofone ?
O cidadão de modo grosseiro desliga o telefone celular e você sente um alívio porque a ligação chegou ao fim.
Pois é, este é o tal do telefone celular que você não larga, não esquece, lhe aborrece nas horas impróprias, anota recados indesejáveis e se for preciso até faz ligação sem você querer. E você gosta muito, não é ? Ele até dorme a noite ao seu lado? Prefere conversar com ele do que com as outras pessoas? Credo, meu amigo, acho que você está precisando fazer terapia para se livrar desse vírus. Putz, não devia ter escrito “vírus” porque qualquer dia os grandes laboratórios vão lançar no mercado vacinas contra os telefones celulares. E é óbvio que a TV Globo vai jurar de pés juntos que a culpa dessa invenção maldita foi de um tal Bolsona…
“Não ame o seu celular mais do que o seu namorado, noivo, marido, pais, filhos, netos, irmãos, primos, e os humanos. Goste sem paixão e nem necessidade doentia.
Lembre-se ele é só um aparelho que para funcionar precisa de você. Portanto não seja seu escravo!”
Édson Vidal Pinto