Atos de Humanidade
Há dias estou me perguntando o que são decisões humanitárias dentro da esfera judicial que possa justificar tratamento contrário à lei. Embora não mais atualizado com as modificações introduzidas mais recentemente na legislação penal -, lembro existir no Direito Penal o instituto do “perdão judicial” concedido àqueles em que o mal do crime é bem pior do que o castigo da pena. Exemplo: o pai que ao fazer uma manobra com o carro, atropela e mata um filho menor; ou um filho que segura um revólver que acidentalmente dispara e mata a própria mãe.
Evidente que a punição do Estado aos autores desses crimes não encontra nenhuma razão plausível e, por isso, o perdão tem induvidosa conotação humanitária. Diferente do chamado “perdão judicial” concedido ao agente condenado caso este cumpra condições ditadas em lei. Sinceramente não lembro de qualquer outra previsão legal que se ajuste com a caridade cristã ou ato de humanidade. Até porquê a pena é sinônimo de castigo imposto pelo Estado. Existe, sim, os benefícios legais concedidos aos condenados quando estes têm bom comportamento, trabalham no presídio e obedecem às regras de segurança. Daí a progressão de regime da prisão fechada para aberta, depois à prisão semi-aberta até alcançar de novo a liberdade.
Bem, como este espaço não objetivo ensinar ninguém a Ciência do Direito Penal, vou me ater ao que interessa. O Juiz quando prolata sua decisão de mérito tem que “fundamentar” o suficiente as suas razões de convencimento do porquê está (no caso do processo penal) absolvendo ou condenando o réu. Nesse espaço da sentença ele pode usar e abusar de argumentos compatíveis à causa, inclusive tecer abordes sobre a humanidade, sentimentos, família e tudo o mais que entenda importante para a devida prestação jurisdicional. Porém não pode olvidar da lei e nem colidir com a mesma. No entanto proferir uma decisão exclusivamente dando ênfase que o propósito é atender situação humanitária, evidente, que a mesma é teratológica (ou fantasmagórica).
Daí decisão do Toffoli de autorizar que milhares de presos perigosos que estão cumprindo pena em regime fechado dentro de presídios sejam colocados em liberdade, por ato de humanidade, em razão do coronavírus é inaceitável e tecnicamente absurda. Seria justificável se o presídio estivesse infectado pelo vírus, transferir os presos não portadores do mesmo para outro estabelecimento congênere, permanecendo os infectados na unidade ou vice -versa. Colocar na rua, jamais! Outra decisão esquisita ditada no âmbito do Tribunal do Paraná, só que matéria pertinente a esfera do Direito de Família, foi a de permitir que o indivíduo inadimplente com a pensão alimentícia possa ficar preso no próprio domicílio. Ora, não existe nenhuma notícia de que algum estabelecimento prisional no Paraná esteja sendo ponto do coronavírus.
E nem poderia: pois todos os internos do sistema estão em “reclusão domiciliar”. Agora, se é para evitar que o inadimplente da pensão possa ingressar no presídio e contaminar os demais, bastaria determinar que o mesmo cumprisse quarentena no Centro de Triagem, antes de ser implantado na prisão. Não parecem lógicas as preocupadas decisões proferidas por juízes tão humanitários para favorecer indivíduos de alta periculosidade, bem como, àqueles irresponsáveis com suas proles. O Juiz cumpre a lei mas não é dono dela a ponto de querer ajustar a punição dos infratores de acordo com a conveniência do momento ou seu próprio ponto de vista, porque a lei foi feita para ser cumprida.
Nenhum bandido quando assalta, mata ou estupra tem senso de humanidade para com sua vítima. E o pai que se furta em alimentar sua prole é tão insensível quanto qualquer criminoso. Acho que modernamente tem muito juiz que deveria ser político, beato ou embusteiro...
“Claro que o Juiz quando julga não pode ser insensível e nem absurdamente
prático. Deve ser maleável às circunstâncias do fato e obediente ao espírito da lei. Contudo lhe é defeso decidir unicamente para atender excepcional conveniência momentânea, mas sem respaldo legal”.
Edson Vidal Pinto
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